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O livro A vida intelectual, de Antonin-Dalmace Sertillanges, é um pequeno tratado de amor à verdade e, por isso mesmo, reeditar este livro hoje é um escândalo. Se o sacerdote, ao lançar a obra em plena França de 1921, já ultrajou milhares de estultos que se consideravam sérios, imagine-se como os “intelectuais” de hoje considerarão afrontosas tais declarações, afinal, ele explica um intelectual como quem pretende fazer do estudo e da produção letrada a sua própria vida.
Entre todos os atributos os quais confere a essa espécie, não há uma única menção aos prestigiosos bancos de mestrado, doutorado e pós-doutorado. Não há nenhuma demonstração de amor pela cátedra — nem de desdém. Simplesmente não há nada. O mero fato de não atrelar os “intelectuais” à universidade já é certamente um ultraje para a maior parte dos que se entendem detentores desse título.
Nosso escritor assume o que teimamos esconder: a verdade pode vir de qualquer lado, do ser humano mais prestigiado ao mais marginalizado, do livro mais ovacionado ao mais menosprezado —, e o intelectual, sedento por alcançá-la, não se importará com sua origem.
Já que “especialistas” catedráticos são cada vez mais vistos como a fonte suprema do saber, a defesa dessa “mente ampla”, apreciadora da realidade inteira, não apenas de fatias – parece um continho de fadas. Em suas palavras: “Toda ciência cultivada isoladamente não é somente imperfeita, mas oferece perigos conhecidos por todos os homens sensatos. As matemáticas isoladas falseiam o juízo, habituando-o a um rigor que nenhuma outra ciência permite e muito menos o permite a vida real”. Portanto, cada ciência, se tomada sozinha, deixa seu detentor flutuando, sem a menor ideia do contexto no qual se insere, daí o perigo de ele chegar a conclusões presunçosas sobre si e sobre o mundo.
Enfim, Sertillanges desmorona vários pilares pressupostos a um erudito moderno, mas vale dizer que o principal deles está presente em toda a obra: o espírito reto deve olhar para Deus, afinal a realidade é uma revelação de seu poder. Para o sacerdote — e para os cristãos —, o conhecimento não está separado das raízes, e só é possível encontrá-las no Criador de tudo o que se pretende estudar.
Lara Brenner é professora de Língua Portuguesa.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos