| Foto: Arquivo pessoal

Chego do cinema – escolha do marido, recomendação de amigos. Fomos assistir a Até o último homem, dirigido por Mel Gibson. Por muito tempo ecoará em minha alma a oração do médico Desmond Doss, personagem do filme: “Por favor, Senhor, me ajude a salvar mais um. Me ajude a salvar mais um”. Como não vincular o enredo, baseado em fatos reais, ao trabalho de capelania hospitalar?

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Nos últimos quatro meses, vivi uma experiência singular ao lado da gestante em morte encefálica Frankielen da Silva Zampoli e sua família. A jovem de 21 anos carregava em seu ventre gêmeos, que foram amados desde o primeiro momento. A gestação se desenvolveria em um leito de UTI, cercada de todo o cuidado médico, mas também com todo o amor e afeto que pudéssemos dar. Sem amor, não há cuidado. O ambiente foi decorado com fotos dos pais e avós dos bebês. Valor familiar, a Bíblia estava presente nos atendimentos, enquanto conversávamos com os bebês.

Cuidar de pessoas combina com essa musicalidade tecida nas entranhas

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Antes de trazer música para o box 19 da UTI Verde, me aproximei com reverência para ouvir, em meio aos sons de separação, também sons de acolhimento. Morte e vida se encontravam na mesma sinfonia! O que moveu a mim e a tantos outros? Jamais terei a resposta. Desconfio que tenha a ver com as entranhas. Útero, órgão feminino emblemático. Ele acolhe, alimenta, provê, expulsa – cumpre seu propósito divino.

Cuidar de pessoas combina com essa musicalidade tecida nas entranhas. O pulsar dos corações dos pequenos embriões embalou a minha fé cristã. Deles recebi música, para eles ofereci música. Acalantos, canções de brincar, histórias, orações, hinos em diversas sonoridades e instrumentações. Cordas, percussão, teclas, sopros, voz. Deles recebi movimento e ofereci toque, carinho. Mãe embala. Mesmo sem entoar melodias, cantamos nossas emoções, sonhos, medos, fé. As mãos buscam a barriga querendo tocar os bebês. A voz acompanha as mãos e vice-versa. Aos bebês emprestei o que ganhei: calor, toque, silêncio, canção.

A primeira visita pastoral com música foi no lançamento da campanha ELO Solidário, em que cerca de 500 voluntários cristãos ressignificaram o ambiente hospitalar com música durante um mês, em dezembro. Gente do bem, que doou de si em visitas pastorais leito a leito, orações, reflexões bíblicas e canções. Os 30 parceiros mobilizadores da campanha (igrejas e ONGs) arrecadaram por volta de 15 mil itens, entre fraldas e kits de higiene pessoal que foram entregues à assistência social do hospital para auxiliar famílias no cuidado dos seus. Conveniado ao SUS, o Hospital do Rocio atendeu em 2016 pacientes vindos de cerca de 170 municípios paranaenses.

No caso de Frankielen, recebi retaguarda de familiares, amigos, pastores, padres, teólogos, musicoterapeutas, profissionais da saúde e da equipe da ELO Capelania. Como não reconhecer a presença de amigos e voluntários gerando vida, ainda que anonimamente, apoiando direção e equipe multidisciplinar no cumprimento de sua vocação? Em cada atendimento, seja ao lado dos gêmeos Ana Vitória e Asaph, do pai Muriel e da avó Angela, ou a pacientes, familiares e colaboradores do Hospital do Rocio, que eu me lembre do privilégio de gestar vida!

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“Por favor, Senhor, me ajude a gerar mais um. A gerar mais um.” Seja você resposta desta oração onde você estiver. Empreste sua fé e voz!

Erika Cecconi Borges Massa Checan, graduada em Música Sacra e em Musicoterapia, é membro da equipe pastoral da Primeira Igreja Batista de Curitiba e idealizadora e coordenadora do serviço de capelania ELO, do Hospital do Rocio, em Campo Largo.