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Um cidadão de um país desenvolvido da OCDE (Organização para Cooperação e Desen­­volvimento Econômico), como EUA, Canadá ou Holanda, fica 16,5% do tempo total de sua vida na condição de aposentado, inativo. Já, no Brasil, é o dobro: 31% da vida. A explicação: aqui não há idade mínima para se aposentar. Basta o homem comprovar 35 anos de contribuição, e a mulher, 30. Por isso a idade média dessas aposentadorias é de só 55 anos.

Na reforma da Previdência de 1998, quando a idade média de aposentadoria do brasileiro era de 49 anos, por um erro ao votar do então deputado governista Antônio Kandir, não foi aprovada uma idade mínima para aposentadoria do trabalhador do setor privado. O Brasil é um dos raros países a não adotar essa carência. São só quatro no mundo todo.

Sem esse mecanismo fundamental em qualquer regime previdenciário, o governo federal, para estimular as pessoas a trabalharem mais, criou o fator previdenciário em 1999. Ele determina a aposentadoria inicial. Combina o tempo e a alíquota de contribuição, a idade e a expectativa de sobrevida após a aposentadoria.

Antes dele, a aposentadoria era a média dos últimos 36 salários. Não refletia o que o trabalhador contribuiu para o INSS ao longo da vida, pois, no fim da car­­reira, ganhamos bem mais do que no começo. Daí, agora, considerar-se os 80% melhores salários de toda a vida laborativa, desde julho de 1994, quando da im­­plantação do Plano Real e a conquista da estabilidade da moeda, e multiplicá-lo pelo fator.

Vale lembrar que o INSS arrecada de quem trabalha para pagar, no mesmo mês, os aposentados e ainda falta dinheiro – mais de R$ 50 bilhões neste ano. Não há reservas. Mas, com o fator, as contribuições do trabalhador formam, hipoteticamente, uma poupança virtual que é dividida na hora da aposentadoria pelos anos que ele vai recebê-la.

O momento de se aposentar, ele decide. Mas, se se aposentar cedo, aos 50 anos, a poupança será menor, serão muitos anos recebendo e o valor mensal baixo. Já se se aposentar mais tarde, aos 60, a poupança será maior. Serão menos anos aposentado e o valor alto.

Resumindo: ele penaliza quem, mesmo podendo, se aposenta precocemente. A integralidade é só para quem posterga a aposentadoria e contribui por mais alguns anos.

A fórmula atual é desvantajosa em relação à anterior. Mas com o fator, o aposentado recebe o que contribuiu. É o tal do equilíbrio financeiro e atuarial, sem o qual não há previdência que se sustente. E que é a base da melhor previdência do mundo, que é a dos fundos de pensão.

Todos sonhamos com uma aposentadoria polpuda e prematura – até eu –, mas previdência é uma mera consequência da vida laborativa. Se durante todo o tempo em que trabalhou, uma pessoa recebeu pouco, não é na aposentadoria que isso vai mudar.

Aposentadoria não é prêmio de loteria ou herança. E nem segundo salário, como muitos buscam, aposentando-se precocemente e continuando a trabalhar o que quase sempre é uma necessidade.

O fator diminuiu as despesas do INSS em R$ 10 bilhões em dez anos. Mas isso não é para mim o mais importante. O que importa é que, queiramos ou não, matemática e financeiramente, o fator é tecnicamen­­te correto e justo, mesmo não sendo do agrado da qua­­se totalidade dos trabalhadores, que se sentem pre­­judicados em relação à situação anterior a 1999.

Na semana passada, a Câmara promoveu o maior ato de irresponsabilidade dos últimos dez anos: votou o fim do fator previdenciário. Com o fim do fator, a aposentadoria voltaria a ser calculada pela média simples dos últimos 36 salários, e cairia por terra o equilíbrio financeiro e atuarial, ou seja, aposentadorias proporcionais às contribuições feitas pelo trabalhador. Isso representaria a quebra definitiva de nossa previdência como a conhecemos. Para quem não acredita nisso, há um exemplo mais antigo, o da Argentina, e um atual, o da Grécia.

Mas o presidente Lula está pensando responsavelmente nas contas do governo num momento crucial para a economia e na aposentadoria de nossos filhos e netos: declarou que vai vetar a proposta.

Continuo apostando na sensatez de que o fator não cai. Agora, se cair, vem a idade mínima. É a única alternativa. Não se conhece no mundo todo outra saída.

Como dizia o filósofo Jean Jaques Rousseau, minha função é dizer a verdade, não convencê-los dela, leitores. Mas espero, pelo menos, tê-los ajudado a entender a situação. Sei que a maioria das pessoas não vai apoiar a manutenção do fator, mas ruim com ele, pior sem ele.

Renato Follador é consultor em previdência e presidente do Fundo Paraná de Previdência Multipatrocinadawww.renatofollador.com.br.

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