Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Opinião do dia 2

Vitória na luta contra a violência doméstica

A recente decisão do Supremo Tribunal Federal indica que é o momento, agora, de fortalecer os mecanismos existentes na luta contra esse problema devastador em nossa sociedade

Na última semana o Supremo Tribunal Federal deu um passo decisivo no combate à violência doméstica e familiar contra a mulher, declarando a constitucionalidade da Lei 11.340/2006 (conhecida como Lei Maria da Penha) e decidindo pela natureza incondicionada da ação penal em caso de crime de lesão corporal praticado contra a mulher em ambiente doméstico e/ou familiar.

Por um lado, a declaração da constitucionalidade da lei assenta de uma vez por todas a obrigatoriedade da sua aplicação na forma como foi promulgada em todo o território nacional, não havendo mais qualquer margem para situações diferentes do que as previstas no texto legal.

Por outro, fixando-se a natureza incondicionada da ação penal, tem-se que, na prática, não há necessidade de que a vítima autorize o Estado a processar o agressor pelo crime. Ou seja, diante da notícia da ocorrência do crime de lesão corporal praticado em ambiente familiar, o Ministério Público dará início à ação penal independentemente da vontade da mulher agredida, e o juiz, após o trâmite legal, julgará a ação, podendo vir a condenar o acusado, também independentemente da representação da vítima. Assim, além da própria vítima, qualquer pessoa que tenha conhecimento da ocorrência de um crime contra uma mulher no ambiente familiar poderá – e deverá – noticiá-lo às autoridades competentes. Pode-se dizer que ao decidir dessa forma, o STF pôs fim à questão polêmica que surgiu desde a promulgação da Lei 11340/2006, trazendo significativo avanço quanto à sua aplicação e, consequentemente, na luta contra a violência doméstica e familiar contra a mulher.

Isso porque em diversas ocasiões o que se verificava nos Juizados especializados era a renúncia da vítima à representação anteriormente oferecida, por razões muitas vezes ligadas à pressão ou ameaça exercidas pelo próprio agressor ou sua família, ou mesmo pela dependência econômica que mantinha em relação a ele.

O que se deve considerar, portanto, para além do questionável "em briga de marido e mulher não se mete a colher", é que a violência doméstica e familiar contra a mulher deve ser vista como questão ligada à dignidade da pessoa humana e, por isso mesmo, assunto que diz respeito a toda a sociedade. É, sim, tema de interesse público. Basta lembrar, por exemplo, que a própria Comissão Interamericana de Direitos Humanos teve participação decisiva no surgimento da Lei Maria da Penha quando, na época em que Maria da Penha Maia Fernandes foi vítima de inúmeros atos de violência por parte de seu marido, recomendou que os crimes fossem vistos como crimes de gênero por parte do Estado brasileiro, entendendo, ainda, que a violência sofrida por Maria da Penha era fruto da ineficiência do Judiciário, recomendando uma "investigação séria" e a responsabilização penal do autor, além da adoção de medidas em caráter nacional por parte do Estado para combater a violência contra a mulher.

A recente decisão do Supremo Tribunal Federal indica que é o momento, agora, de fortalecer os mecanismos existentes na luta contra esse problema devastador em nossa sociedade, seja através do fim da impunidade dos crimes noticiados, seja por meio de discussões sobre o tema, que levem ao amadurecimento e aprimoramento de nossos pontos de vista.

Temos um grande caminho a percorrer. Assentadas, definitivamente, pelo STF questões de natureza jurídica, passemos à melhoria das estruturas existentes no combate à violência doméstica.

Danielle Gonçalves Thomé, primeira promotora de Justiça a atuar no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, em Curitiba.

Sínteses – Quais os reflexos da decisão do STF sobre a Lei Maria da Penha?

Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.