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Em 2023 foram registrados no país 2.222 incêndios estruturais comerciais, ou seja, aqueles que ocorrem em locais com circulação de pessoas (shoppings, hospitais, museus, escolas, prédios públicos etc.), de acordo com dados do Instituto Sprinkler Brasil (ISB). Grande parte desses incêndios acontece por problemas de qualidade de equipamento como extintores de incêndio, falta de manutenção, erros de projetos e de instalação, além de problemas de treinamento da mão de obra.
A legislação de prevenção e combate a incêndios é estadual e a do Paraná é uma das mais avançadas do país, servindo de modelo para grande parte do Brasil. Mas nem todos os estabelecimentos aplicam corretamente. É dever do responsável técnico em prevenção contra incêndios da edificação testar e certificar o funcionamento dos sistemas. O estado exige a instalação dos sistemas de prevenção e combate, mas não tem efetivo suficiente para fiscalizar todas as edificações. Com isso, temos sistemas instalados por todo o Brasil que teoricamente atendem à legislação, mas que provavelmente não funcionarão e isso só será descoberto no pior momento, durante uma ocorrência de incêndio.
Em ambientes educacionais, como escolas e universidades, o treinamento sobre o uso de extintores costuma ser insuficiente. A maioria das pessoas lembra de simulações de evacuação, mas não de lições práticas sobre o manuseio adequado de extintores
A prevenção contra incêndios não deve ser vista como um custo para o negócio, mas sim como um investimento em responsabilidade social, reputação da marca e, inclusive, de redução de custos. Devemos partir do princípio que incidentes acontecem e, quando ocorrem em estabelecimentos que não estão preparados, podem gerar danos irreparáveis. Se puxarmos pela memória, podemos trazer vários exemplos, como o incêndio que destruiu o Museu Nacional, em São Paulo, e resultou em perdas incalculáveis do ponto de vista histórico e científico, mas também gerou altos custos de recuperação, com uma obra de reconstrução orçada em R$ 69 milhões.
Um pouco mais distante, mas não menos chocante foi a tragédia na Boate Kiss (2013, Santa Maria, RS). Um dos incêndios mais devastadores do país, com 242 mortes e 636 feridos. As indenizações pagas pelo poder público e pela boate chegaram a valores significativos. Em 2022, o Ministério Público Federal firmou um acordo para pagamento de R$ 60 milhões às famílias das vítimas.
Casos como estes acendem um alerta para a sociedade brasileira, que passa a cobrar mais fiscalização do poder público e maior preocupação da iniciativa privada. Mas ainda caminhamos em passos lentos. Enquanto em países como Japão e Alemanha, estabelecimentos comerciais utilizam sistemas de inteligência artificial para monitoramento de incêndios, com sensores térmicos avançados e dispositivos de supressão automáticos em áreas críticas, grande parte dos estabelecimentos no Brasil ainda utilizam sistemas de prevenção mais básicos que requerem a ação humana para o funcionamento, como extintores e hidrantes, obrigatórios no país desde a década de 1970, quando os Corpos de Bombeiros passaram a ser responsáveis pela fiscalização.
Uma pesquisa realizada pelo Instituto Ipsos a pedido do ISB junto a empresas com mais de 250 funcionários, revelou que o grau de adoção de sprinklers nas empresas brasileiras é baixo. Apenas 36% das 300 companhias entrevistadas pelo Ipsos disseram contar com sistemas deste tipo em suas instalações. Os sprinklers são dispositivos automáticos de combate a incêndios que, ao detectarem calor acima de um determinado limite, liberam água para controlar ou extinguir o fogo. Diferentemente de alarmes de incêndio, que apenas notificam sobre a ocorrência de um incêndio, os sprinklers atuam ativamente no combate ao fogo.
Ao combater o fogo de maneira rápida e localizada, os sprinklers reduzem significativamente os danos causados pelo incêndio e, em muitos casos, evitam que ele se propague, diminuindo a necessidade de evacuação em massa e grandes prejuízos materiais. Ao contrário de extintores manuais ou hidrantes, os sprinklers são ativados automaticamente sem necessidade de intervenção humana, o que garante uma resposta rápida, mesmo em ambientes sem supervisão.
Estudos recentes têm mostrado uma falta significativa de conhecimento sobre o uso adequado de extintores de incêndio. Uma pesquisa realizada pela Fireline destacou que cerca de 80% dos incêndios em ambientes comerciais e não residenciais poderiam ser controlados de forma eficaz por um extintor de incêndio, mas muitas pessoas não possuem o treinamento necessário para operá-los corretamente. Outro experimento, conduzido pela Underwriters Laboratories, mostrou que, sem treinamento prévio, muitas pessoas tiveram dificuldades com técnicas básicas, como direcionar o jato para a base do fogo e seguir protocolos de segurança. Em ambientes educacionais, como escolas e universidades, o treinamento sobre o uso de extintores costuma ser insuficiente. A maioria das pessoas lembra de simulações de evacuação, mas não de lições práticas sobre o manuseio adequado de extintores.
E os sprinklers são apenas um exemplo da tecnologia já disponibilizada no mercado nacional. Grandes projetos envolvem tratamento antichamas nas estruturas, selagem de shafts e dutos de instalação, aplicação de firestop nas fachadas de vidro e novos materiais de acabamento e revestimentos utilizados em pisos, paredes, divisórias, tetos e forros, com padrões internacionais de prevenção à propagação de chamas. Alguns estabelecimentos já utilizam um sistema de extração de fumaça que, em caso de incêndio, remove rapidamente a fumaça tóxica, com velocidade de 5 metros por segundo, garantindo maior segurança até a evacuação total dos ocupantes.
Por isso, é hora de aproveitar a tecnologia disponível no mercado e investir na proteção de clientes, funcionários e do patrimônio da organização. E a prevenção de incêndio deve ser parte crucial de qualquer projeto estrutural, com um planejamento rigoroso, a atenção às normas de cada estado, a escolha de materiais de qualidade e o treinamento correto da brigada de incêndio. Ambientes comerciais que priorizam a segurança criam espaços mais atrativos e confiáveis para clientes, impactando diretamente na continuidade das operações e no sucesso do empreendimento.
José Renato Nogaroli Filho é engenheiro civil, especialista em Engenharia de Segurança Contra Incêndio e Pânico e sócio gestor da Nogaroli Engenharia.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos