• Carregando...

A taxa de câmbio em setembro retomou sua tendência de valorização do real após o episódio da crise no segmento de crédito imobiliário americano. Esse processo de valorização pode levar o país a uma rota de crescimento que não seja sustentável, a médio prazo, e o nível da taxa de juros tem um papel crucial na criação desse cenário.

Isso ocorre porque um dos principais determinantes do comportamento do setor externo, no que diz respeito à formação da taxa de câmbio, é a política de juros elevados. A taxa de juros real brasileira é uma das mais altas do mundo, o que cria um espaço de arbitragem internacional de juros, ou seja, possibilidades de ganhos financeiros ao permitir que os agentes econômicos tomem recursos no mercado internacional, a juros baixos, e apliquem em títulos da dívida pública brasileira, a juros altos. Essa entrada de capitais especulativos aumenta a oferta de dólares no Brasil e produz valorização cambial.

Por um lado, a valorização prejudica a competitividade dos produtores brasileiros devido ao encarecimento dos bens domésticos em relação aos internacionais. Isso significa que diminui o montante exportado e sobe o nível de importados. Por outro lado, a valorização eleva ainda mais os ganhos dos investidores no mercado financeiro, pois agora cada real compra mais dólares.

Para entender tal mecanismo, suponha-se que a taxa de câmbio seja tal que se troque US$ 1 por R$ 2. Um investidor que tenha US$ 1.000 irá comprar R$ 2.000 em títulos do governo brasileiro. Se o real se valoriza de modo que para US$ 1,00 se compre apenas R$ 1,80, mesmo que não se considere os ganhos com juros, o investidor consegue trocar os R$ 2.000 por US$ 1.111,11 (=2.000,00/ 1,80). Assim, o investidor teve um ganho de US$ 111,11 ou 11,11% devido à valorização do câmbio.

Esse mecanismo especulativo é um dos responsáveis pela valorização do câmbio e, a menos que a política monetária não se altere ou que ocorram choques externos consideráveis, a tendência é de mais valorização nos próximos meses.

Nada na economia, atualmente, impede que o real chegue à cotação R$ 1,70 ou R$ 1,60. A principal causa dos juros elevados é a idéia fixa dos gestores da política monetária brasileira em combater uma inflação de demanda (mais consumo) cuja existência é duvidosa.

Com o dólar barato, exportamos menos e importamos mais. Assim, há uma tendência de queda do saldo na balança comercial (exportações menos importações) e aumento, mais do que proporcional, no saldo da conta de capitais em razão da entrada de capital financeiro de curto prazo, atraído pelos ganhos proporcionados pela nossa alta taxa de juros. Como resultado, o nível das reservas brasileiras continua em elevação. Ele aumentou em US$ 5,2 bilhões, em agosto. A elevação só não foi maior em função da crise imobiliária dos EUA que reduziu consideravelmente o fluxo de ingresso de capital financeiro.

O governo, conscientemente ou não, está trocando equilíbrio das contas externas brasileiras que, atualmente, tem como base o superávit na balança comercial por um equilíbrio financeiro, ou seja, dependente da entrada de fluxo de capitais. Esse movimento torna o país mais vulnerável às crises externas, pois dependemos da decisão de o investir tomar recursos estrangeiros para aplicar no Brasil.

A história recente da economia brasileira é um bom exemplo do risco desse política. Sofremos os reflexos negativos das crises mexicana, asiática e russa sobre a nossa economia nos anos 90 e tivemos nossa própria crise no início de 1999. Devido à sua curta memória, o governo está trilhando o mesmo caminho que levou nossa economia às crises cambiais do passado recente.

João Basilio Pereima Neto é doutorando em Economia pela UFPR e professor/coordenador de Pós-Graduação em Finanças Corporativas e Mercados Financeiros da UniBrasil.

Luciano Nakabashi é doutor em Economia e professor adjunto do Departamento de Economia da UFPR.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]