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De início, quais são, afinal, as reais opções em debate? Não que o voto facultativo precise de maior esclarecimento. Mas que "voto obrigatório" faria sentido hoje defender? Alguém pretende fazê-lo seriamente, ou trata-se apenas de advogar o modelo atual, um arremedo de voto facultativo disfarçado de obrigatório? Sabemos que essa obrigação é mais penosa que seu descumprimento, uma multa de R$ 3,50 pagos sem fila logo depois da eleição.

Talvez se pense que obrigar as pessoas a ir às urnas é fazê-las pensar em política: é o chamado "argumento pedagógico". Mas ser obrigado a apertar um botão é mais pedagógico que sofrer as consequências da omissão política? Não me parece, ademais, uma boa pedagogia enganar o eleitor acerca do verdadeiro significado do seu gesto político mais elementar: exercer um direito (e não cumprir um dever). Minha aversão pelo voto "obrigatório", antes de mais, exprime minha recusa pessoal à naturalidade com que em nosso país admitimos esse tipo de farsa.

O voto facultativo não suprimirá nenhum direito, apenas acrescentará um novo: o de não votar caso não se queira (em vez ser obrigado a protestar na urna contra todos). E encerrará um longo processo de emancipação e restituição ampla dos direitos políticos. Nos idos dos anos 80, o senador Franco Montoro proclamou que o Brasil ainda não estava pronto para tal liberdade. Eu felizmente nunca pensei que o país devesse ser cerceado em nenhuma liberdade democrática, mas hoje, se há saldo a tirar das manifestações de junho, temos mais razão que nunca para pensar isso.

Há, porém, quem despreze essas razões. Os eleitos para mandatos públicos tendem ao conservadorismo, ao menos na medida em que souberem usar o sistema existente. Outros pretendem chancelar a tutela dos direitos alheios em nome de suas conjecturas pessoais ou "científicas". De modo geral, penso que o principal problema é supor que se possa julgar essa questão sem ir além de um cálculo de consequências que tende a ser tão precário quanto casuísta.

Por exemplo, há quem diga que as eleições no Brasil são uma festa cívica, mas em países onde o voto é facultativo são um ritual burocrático. Visão muito superficial da vida política estrangeira. E, se festa for a eleição brasileira, por que não poderia o mesmo aparato publicitário atual ser usado para garantir e festejar o exercício dos direitos democráticos?

Outros calculam que o número de votantes será menor e, portanto, a democracia estará em risco. Concedendo que a hipótese seja correta, o valor maior do voto individual de quem votar seria um ganho desprezível? Bem como a clarificação do contrato que o voto passa a estabelecer entre eleitor e eleito? As hipóteses catastróficas andam sempre de mãos dadas com a restrição de direitos.

Ou especula-se que os pobres votarão menos e serão assim prejudicados, posto que não é racional beneficiar quem não elege. Mas nossa experiência parece mostrar o oposto: os pobres não são muitas vezes mantidos nessa condição pelos eleitos, justamente porque isso permite a reiteração do estado de coisas? Bem mais razoável parece-me supor que, ricos ou pobres, serão eleitores mais interessados os que pesarão nas urnas com o voto facultativo, razão essa que, sozinha, me parece justificar a experiência.

Luiz Eva, doutor em Filosofia pela USP e pós-doutor em Filosofia pela Johns Hopkins University e Universidade de Nantes, é professor associado do Departamento de Filosofia da UFPR.

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