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Não há democracia plena sem o voto secreto para o eleitor, nem com voto secreto para o eleito. O eleitor deve ter seu voto protegido, mas os eleitos não devem ter seus votos escondidos. Ele foi eleito pela escolha do eleitor, que tem o direito de saber como vota quem o representa.

É um contrassenso que um eleitor confie seu voto a um candidato e, depois da eleição, fique sem saber como seu vereador, deputado ou senador vota no Parlamento em assuntos que interessam ao eleitor, à cidade e ao país. O voto secreto no Congresso Nacional é uma excrescência na democracia.

Alguns dizem que o sigilo do voto do parlamentar deve ser protegido de pressões do Poder Executivo. Isso podia se justificar durante o regime autoritário, em que a frágil oposição precisava evitar morte, prisão ou exílio por causa de um voto. Outro argumento usado a favor do voto secreto é proteger o parlamentar quando vota na escolha de embaixadores, juízes de tribunais superiores e alguns outros diretores de agências. Mas, quando se tem medo de votar contra a nomeação de um juiz é porque se espera ter benefícios quando vota a seu favor, ou, quando escondido no manto do voto secreto, diz-se ter votado nele, mesmo mentindo. O voto secreto é um manto da mentira e precisa ser abolido. Achar que um juiz vai perseguir um parlamentar que votou contra ele é reconhecer que a Justiça foi politizada. A solução exige coragem para modificar a maneira de escolher os juízes, não de esconder o voto do parlamentar.

Da mesma maneira que é preciso saber todo voto de cada parlamentar, é preciso fazer o voto do parlamentar ser também obrigatório em todas as votações, como o é a participação do eleitor em todas as eleições. O voto secreto do parlamentar é uma vergonha da democracia, mas o voto escondido por trás do voto das lideranças também é vergonha e humilhação para o parlamentar. É preciso acabar com o voto secreto e explicitar o voto de cada parlamentar, acabando com o voto com o corpo: "quem estiver de acordo fique como está", como é tão comum no dia a dia do Parlamento brasileiro.

Além de vergonhoso e humilhante, isso tem permitido a aprovação de atos e leis sem o conhecimento dos próprios parlamentares, com artigos e parágrafos contrabandeados, por distração ou omissão dos parlamentares presentes, às vezes desconhecendo a pauta da votação naquele dia. A desculpa de que o voto nominal faria impossível aprovar qualquer coisa porque os parlamentares nunca estão presentes é ainda mais vergonhoso e injustificável. Se for preciso, que mudem as regras para obrigar a presença no plenário na hora da votação – como qualquer trabalhador –, ou que apresente suas justificativas para a ausência, ou que deixe o eleitor saber que estava ausente sem justificativa; mas jamais se escondendo debaixo do voto dito de liderança.

O voto do eleitor na urna é obrigatório e secreto; o voto do eleito deve ser obrigatório e transparente em cada caso, para que o seu eleitor saiba como ele vota, e possa lembrar na eleição seguinte se o seu candidato votou como ele deseja ou não. Nenhum eleito deve ficar preso à vontade de seu eleitor, até porque os eleitores têm posições variadas. Deve votar conforme seus compromissos de campanha e de sua consciência em cada caso, mas publicamente. Ao eleitor cabe se manifestar nas urnas, secretamente, para reeleger ou não o seu candidato.

Cristovam Buarque, professor da UnB, é senador pelo PDT-DF.

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