O fechamento do balanço financeiro da União referente a 2004, divulgado na semana passada, mostrou que a carga tributária nunca foi tão alta em toda a história da República. Somada toda arrecadação dos governos federal, estaduais e municipais, a montanha de dinheiro que foi para os cofres públicos atingiu 35,91% de toda a riqueza nacional produzida no ano passado (Produto Interno Bruto PIB). A parte correspondente aos tributos federais representou 25,04% do PIB. Literalmente, esta é a parte do leão, pois apenas 10,87% da receita foram divididos entre os 27 estados (9,36%) e os 5 mil municípios (1,52%). A grande questão é saber como essa dinheirama está sendo empregada.
Em 2005, a arrecadação federal vem se comportando de maneira ainda mais exuberante do que esta verificada no ano anterior. Mês após mês, o Tesouro Nacional bate novos recordes. Em tese, isto poderia significar que, se o pagamento de impostos cresceu é porque a economia está crescendo na mesma proporção. Entretanto, muito embora quase todos os setores venham apresentando desempenho bastante razoável, é mais plausível admitir que o aumento da receita se deve muito mais ao aperfeiçoamento e à eficiência da máquina arrecadatória. Então, apesar de alguns "pacotes de bondades" baixado pelo governo e de suas seguidas promessas de redução, não é improvável que fechemos 2005 com uma carga tributária ainda maior do que a de 2004.
Sabemos todos que é com base em suas previsões de arrecadação que os governos fazem também suas previsões de despesa. A esse conjunto de previsões se dá o nome de orçamento público. Cada destinação de recurso representa o modo como o administrador define as prioridades de suas políticas públicas. Em suma, portanto, o orçamento, com seu jogo de verbas entre os vários setores, é o espelho prático do planejamento da ação governamental. E executar tal orçamento de conformidade com o que foi estabelecido dá bem idéia da eficiência e da proficiência dos governos.
Pois bem. Relatório divulgado também na semana passada pelo Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi) mostra que o Orçamento da União vem sendo executado de modo claramente deficiente. Basta ver que, até agora, nenhum dos programas recebeu o que lhe era destinado. Em grandes linhas, o Orçamento de 2005 prevê a aplicação de R$ 22 bilhões em investimentos, mas apenas R$ 886 milhões foram gastos até o último dia de julho. Ou seja, faltando pouco mais de quatro meses para o término do exercício, só 4% desses recursos foram efetivamente liberados e aplicados. O comportamento na área social decantada como prioridade absoluta do atual governo também apresenta números igualmente insignificantes.
Vejamos alguns exemplos. Entre os ministérios que menos investiram estão os da Educação (5,6% do que teria direito), da Ciência e Tecnologia (5,5%), dos Transportes (5,5%), da Integração Nacional (4,4%), e do Meio Ambiente (3,7%) dos R$ 40,1 milhões. O Ministério da Saúde investiu apenas R$ 80,6 milhões dos R$ 2,6 bilhões disponíveis, o equivalente a 3,2%.
Há diferentes interpretações para esse quadro. A primeira é que o governo está paralisado diante da crise que o assola; perdeu seu poder de iniciativa; está desestruturado do ponto de vista da gestão. Outra é que as prioridades realmente mudaram. Passou a ser encarado como preferível produzir superávits primários cada vez maiores para financiar a monumental dívida pública que investir em programas de desenvolvimento e de melhoria dos serviços públicos. Essa última hipótese encontra respaldo no fato de que, em vez da meta de superávit de 4,25% do PIB, o governo está conseguindo este ano ultrapassar o patamar dos 5%. Ou seja, está tirando o dinheiro que pretendia destinar a investimentos e programas sociais para melhorar o perfil da dívida.
Não deixa de ser uma estratégia aceitável do ponto de vista macroeconômico e a longo prazo, mas é lamentável que isto signifique atrasar outras estratégias de desenvolvimento econômico e social, nas quais o próprio presidente Lula e toda a sociedade brasileira tanto apostavam.
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