Sinto-me verdadeiramente um cidadão do mundo, mesmo confinado a Curitiba. Afinal, posso morar no East Batel, ou em um prédio de sotaque parisiense como Vert Royale, trabalhar no GV Office Center, escolher um sanduíche dentro de meu carro no drive through do McDonalds. Não compro mais nada para entrega em domicílio, pois posso acionar vários serviços de delivery, e liquidações com descontos de 50% não me impressionam minimamente; afinal, tenho à minha disposição várias Sale que me oferecem 50% off sem maiores delongas.
Quando vou fazer uma reles viagem aérea para uma cidade interiorana, sou tratado pelos fiscais de aeroporto como uma ameaça à paz mundial, comparável a um membro da Al-Qaeda: meu tubo de creme de barba que tem 120 ml é sumariamente confiscado pois excede o máximo permitido de 100 ml. Devo tirar todos os metais que estou carregando, cinto, sapatos com palmilhas metálicas, relógio, óculos com aros de ouro; todos esses artefatos têm um potencial letal insuspeitado especialmente a fivela do cinto, explicou-me um atencioso fiscal. Guarda-chuvas (depois de terem sido proibidos) são hoje permitidos se forem retráteis: os tradicionais ainda não são aceitos, pois os atentados cometidos por agentes russos que cutucavam os inimigos com a ponta envenenada de um deles em Londres ainda não foram esquecidos.
Em todos os momentos, meu cosmopolitanismo é incentivado: não participo mais de seminários ou de ciclos de estudos, e sim de workshops onde, de tanto em tanto, as pessoas interrompem o trabalho para um coffee break, nunca para um cafezinho... E, nas empresas que visito, ninguém é mais diretor-geral ou presidente: todos são CEOs, Chief Executive Officers, e há tempos não esbarro com um estagiário, pois agora só existem trainees.
Meus divertimentos seguem a mesma trilha: frequento restaurantes no SoHo, participo de happy hours, meus almoços ligeiros foram trocados por brunchs e, quando faço uma reunião em minha casa, convido meus amigos para um get together e para um all day long. Se for em homenagem a alguem, ofereço um vin dhonneur, nunca um brinde.
Meus pacientes leitores sabem que não sou um fundamentalista em matéria de língua como o Policarpo Quaresma de Lima Barreto, que queria instituir o tupi-guarani como língua oficial brasileira. Nem como o ministro Aldo Rebelo, que, se pudesse, trocaria o nome do campeonato mundial de futebol para campeonato mundial de ludopédio. Vez por outra, salpico termos e nomes em língua estrangeira no que falo ou que escrevo, mas acredito que o mercado já extrapolou todos os limites razoáveis.
Suspeito que o próximo passo será rebatizar os bairros. Como aconteceu com o Capanema, substituído pelo mais glamouroso título de Jardim Botânico, em breve estaremos estreiando novas denominações. Elizabeth, minha mulher, que nasceu no Água Verde e cuja família paterna é do Portão, por exemplo, já está providenciando novos documentos indicando sua origem em Green Water e a de seu pai, em Big Gate.
Belmiro Valverde Jobim Castor é professor do doutorado em Administração da PUCPR e passou sua infância em Black River, na divisa com Saint Catherine State.