Para a Grécia Antiga, a cidade era, antes de tudo, uma comunidade de cidadãos, uma associação de caráter moral. Platão insiste que a escolha de um sítio devia levar em conta a salubridade, vantagens econômicas e o clima psicológico e moral. Fixa o número de habitantes e preconiza a criação da acrópole. As cidades não devem ser fortificadas, pois debilitaria a coragem dos cidadãos.
Já Aristóteles aconselha que, além da salubridade, a escolha deva permitir um abastecimento fácil, separação da água potável de uso comum e defende a especialização dos bairros segundo funções comerciais, residenciais, administrativas e religiosas, sua estruturação em ruas retas, dispostas regularmente.
As walkable communities, ou comunidades amigas dos pedestres, bicicletas e do transporte público, estão entre os conceitos importantes de cidades nos dias atuais. E, para um Brasil eminentemente urbano, isso também acontece.
A cidade passa a ser construída em função do significado que possui para toda a sociedade, numa perspectiva de reapropriação do espaço urbano pelo cidadão. O elemento central é que a sociedade é composta, sobretudo, de redes complexas de relações sociais, que cunham a nossa identidade cultural e são a base da existência das nações. Aí é fundamental escolhermos se queremos pertencer ao mundo do mais ou do menos, a cidade do mais ou do menos.
A cidade do mais é aquela que agrega valor, não desperdiça, ousa, cria, não ofende o meio ambiente, preserva a memória, tem identidade cultural, é sustentável, recicla o lixo, investe nos talentos, não agride seus habitantes. Onde todos os assuntos são coletivos, pois ela acredita que só haverá qualidade total para o indivíduo se houver qualidade total para toda a sociedade. Que acredita que o seu negócio é ser uma cidade inteligente, com infraestrutura invejável, que se comunica entre si, que está conectada com o mundo e que tem como cenário principal o respeito ao ser humano e ao meio ambiente.
A cidade do mais investe, desenvolve e atrai atividades de alto valor agregado. É democrática, transparente, ética, solidária e inclusiva.
Um local de encontro entre pessoas sem medo, onde haja o direito ao sol, ao silêncio, ao ir e vir, ao trabalho, ao lar, à sombra, ao rio limpo, ao livre brincar, às conversas, ao canto dos passarinhos, à história, às tribos, à inclusão, à energia, à paz, à felicidade, à música, à vida. Onde haja diversidade, pratique-se a tolerância, a comunicação simples e direta, viva-se em ambiente urbano sustentável, com edifícios verdes, lixo reciclado, menos emissões de carbono. Onde problemas são transformados em solução e se continue inovando. Amiga da mobilidade e da acessibilidade, com mais poesia. Natural. Humanizada. Uma cidade que seja como um retrato da família, que mostra as nossas referências, a nossa identidade.
Uma cidade de encontros, onde os espaços públicos sejam os cenários desses encontros: aquela que aprende com a natureza e com a natureza das pessoas. É assim que queremos ver as cidades do futuro, hoje.
Sérgio Póvoa Pires é arquiteto e urbanista.
Esta coluna é organizada por Clovis Ultramari, Fabio Duarte, Irã Dudeque e Salvador Gnoato, com arquitetos urbanistas convidados para discutir o futuro das cidades.
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