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| Foto: Aniele Nascimento/Gazeta do Povo

Dos tantos crimes revelados pelas delações premiadas divulgadas na semana passada, um é particularmente pernicioso pelas consequências que não são aparentes: a compra e venda de leis, decretos e medidas provisórias favoráveis às empreiteiras. Deputados e senadores receberam milhões de reais para atuar como legisladores da construtora Odebrecht na Câmara e no Senado. Se a sociedade brasileira tinha alguma dúvida sobre como as leis são feitas no Congresso Nacional, saber como as salsichas são produzidas não provocará qualquer repulsa ou indigestão (obrigado, Otto von Bismarck).

Alguns exemplos das condutas republicanas? O presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB), teria recebido R$ 2 milhões para trabalhar pela aprovação de medidas provisórias de interesse da Odebrecht. Por préstimos similares, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), teria recebido R$ 100 mil da construtora, mesmo valor pago ao deputado Lúcio Vieira Lima, que vem a ser irmão do ex-ministro Geddel Vieira Lima (PMDB), aquele que foi expulso do governo após o episódio do edifício onde tem apartamento na Bahia.

Dois políticos são quase onipresentes na atuação em favor da Odebrecht: o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB), e o líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros. Ambos são citados em vários momentos. Só Jucá teria recebido R$ 22 milhões em troca da atuação nos trâmites de 12 projetos de lei e de medidas provisórias.

Deputados e senadores receberam milhões de reais para atuar como legisladores da Odebrecht

Dois episódios envolvendo a dupla dinâmica são expressivos. No primeiro, segundo a delação do ex-diretor da Odebrecht Cláudio Melo Filho, Jucá e Renan teriam recebido R$ 4 milhões da construtora como “contrapartida ao decisivo apoio” durante a tramitação do Projeto de Resolução do Senado Federal 72/2010, que zerou a alíquota de ICMS nas operações interestaduais com bens e mercadorias importadas do exterior.

Melo Filho afirmou que a Odebrecht pagou pela aprovação de sete medidas provisórias entre os anos de 2005 e 2014. O pagamento, segundo a delação, foi feito diretamente a deputados e senadores ou em forma de doações para campanhas eleitorais. Quatro dessas MPs ainda estão em vigor: MP 449/08, MP 472/09, MP 563/2012 e MP 651/2014.

O segundo episódio foi relatado por Marcelo Odebrecht. Segundo o empresário, houve uma negociação direta com o então ministro da Fazenda Guido Mantega (PT) para que o governo editasse uma MP com o propósito de criar benefícios fiscais para as subsidiárias estrangeiras da construtora. Em seguida, para que a MP fosse convertida em lei, a Odebrecht teria pago R$ 5 milhões a Renan e a Jucá.

Com todas as revelações disponíveis até agora, algumas perguntas inconvenientes se impõem:

Os decretos, as leis e as medidas provisórias aprovados dentro do esquema de corrução continuarão em vigor ou serão revogados?

Como corrigir os efeitos das leis, decretos e medidas provisórias que beneficiaram empresas como a Odebrecht e prejudicaram outras empresas e a sociedade?

Todos os que foram prejudicados serão ressarcidos pelos políticos e empresários envolvidos?

Quais foram os custos econômicos e sociais da aprovação dessas leis, decretos e medidas provisórias?

Além de cobrar essas respostas, a sociedade deve inserir outras pautas no debate. Porque não será o bastante punir somente no âmbito penal os políticos e representantes das empresas envolvidas. Precisamos discutir, por exemplo, o que é preciso fazer para que os prejudicados pelas leis aprovadas em esquemas de corrupção possam processar individualmente políticos e empresários, que responderão pelo ressarcimento dos danos.

Ainda mais fundamental é atacar vigorosamente a origem desse tipo de corrupção mostrada pela Lava Jato: o poder que os políticos têm para colocar o Estado a seu serviço. Se nada for feito, a Lava Jato será, de fato e de direito, um processo permanente de investigação e punição.

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