| Foto: Luís Macedo/Câmara dos Deputados

Toda vez que me perguntam se, no Brasil, reformas políticas são necessárias, respondo com a boutade do diretor do All Souls College ao ser convocado para uma reunião com o presidente da comissão que, na década de 1960, pretendia reformar a Universidade de Oxford: “Mas as coisas já não estão suficientemente más?”

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Como conservador, sou um reformista por natureza. O grande problema que se impõe em discussões do tipo é: quem promoverá as reformas? É aqui, tecnicamente falando, que a porca torce o rabo.

Quando analisamos a biografia, os interesses e o comportamento daqueles que compõem a Câmara dos Deputados e o Senado Federal, especialmente de seus líderes, duvidamos do tipo de mudança que será levada a cabo e podemos imaginar as suas consequências intencionais e não intencionais.

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Qualquer pessoa sensata deveria saber que, em se tratando de política brasileira, nada é tão ruim que não possa piorar. E é assim que o impulso reformista dá lugar à prudência: mais vale manter aquilo que conhecemos e conseguimos combater do que a novidade que favorece a súcia.

Quanto menos virtuosa for a elite política, mais danosa será a sua atuação

Na semana passada tivemos um exemplo que confirma a minha tese. As mudanças perpetradas por deputados e senadores no projeto de lei de combate à corrupção gerou uma reação do Judiciário e do Ministério Público Federal. Talvez levados pelo momento do país, os procuradores que o propuseram foram traídos pela ingenuidade. Acharam que o Congresso Nacional sancionaria sem ressalvas uma lei que dificultaria a vida daqueles políticos que hoje enfrentam problemas na Justiça e dos que, no futuro, enfrentarão.

Faz parte do sistema político de qualquer país a análise e a modificação de projetos de lei apresentados ao parlamento. Até aqui, nenhuma novidade. O que vai definir a qualidade do exame e da alteração das propostas submetidas ao Congresso será a virtude média (ou a sua ausência) dos políticos. Quanto menos virtuosa for a elite política, mais danosa será a sua atuação. Além disso, há os incentivos. Quanto mais incentivos houver para a ação de criminosos na política, maior será o rol de crimes a ser cometido.

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Se a atuação da Lava Jato tem desestimulado a conduta criminosa e provocado mudanças de comportamentos, a aprovação do projeto de lei ora modificado terá o efeito contrário. E com a agravante de ameaçar o trabalho de juízes e promotores a partir do acréscimo do crime de abuso de autoridade. Punir qualquer excesso de agente público é fundamental. Mas a inserção da conduta na mesma norma cheira a enxofre. E o diabo, sabemos, mora nos detalhes.

O embate entre as instituições, ao contrário do que possa parecer, é positivo. O pernicioso hábito político aprofundado pelo presidencialismo de coalizão criou a impressão na sociedade de que o mais adequado é a conciliação como regra – mesmo que se tente conciliar antagonismos que beneficiem grupos políticos e econômicos. Não mesmo. A tensão viva entre o Legislativo, o Executivo e o Judiciário serve para que funcione, de fato, a autonomia e os freios e contrapesos idealizados por Montesquieu na sua teoria da divisão de poderes.

O momento no país é tão crítico que nos deparamos com uma situação esdrúxula: a proposta original apresentada pelo MPF é ruim e pode gerar muitas consequências negativas; as emendas ao projeto de lei cometidas pelos deputados pioraram o soneto. Uma vez aprovado, todos sofreremos as consequências da ingênua confiança que os procuradores depositaram nos políticos. E veremos a interrupção de um fecundo processo de transformação iniciado pela Lava Jato.

Se não reagirmos, lamentaremos parafraseando Otto Lara Resende: o Brasil está onde sempre esteve. É este o país que queremos?