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Bruno Meirinho

A bondade do empresário?

 | Ricardo Stuckert/Fotos Públicas
(Foto: Ricardo Stuckert/Fotos Públicas)

Com todas as atenções centradas no depoimento do ex-presidente Lula perante o juiz federal Sergio Moro, a sociedade se divide em certezas que parecem reduzir a importância do depoimento. Afinal, se as opiniões já são pela condenação ou absolvição, a princípio, nenhuma nova prova precisaria ser realizada.

O depoimento de Lula é importante para a sua defesa, embora pareça irrelevante para a acusação, já suficientemente convicta de toda a verdade a partir dos fatos e suposições existentes. Além disso, os pressupostos da acusação não admitem qualquer prova em sentido contrário, veja só:

Um dos pressupostos da acusação é o de que não existe bondade empresarial e, portanto, não haveria qualquer motivo para ser dada, de presente, a reforma de um imóvel de propriedade do ex-presidente. Qualquer iniciativa dessa natureza implicaria, automaticamente, em uma contrapartida do ex-presidente, que seria feita na forma de articulações em favor da empresa.

Como interpretar as doações de empresas que doavam mais de R$ 10 milhões para campanhas à Presidência?

Outro pressuposto é o de que, se uma empresa recebe recursos públicos e oferece presente às autoridades, os pagamentos são necessariamente propina, pois seria impossível uma empresa dar qualquer vantagem na forma de presente a uma autoridade.

Bom, primeiramente, deveria ser consenso que não é recomendável a qualquer autoridade receber presentes, ainda mais de empresários com contratos públicos, pois a possibilidade de haver alguma conduta antiética envolvida seria muito grande. Justamente por isso existem leis que proíbem essa conduta. Entretanto, quando se trata de um ex-presidente, ou mesmo de uma autoridade em algumas situações não previstas pela lei, a proibição não existe, ou começa a ser duvidosa.

Assim sendo, mesmo sendo algo inadequado e não recomendável, o recebimento de presentes pode não ser ilegal e nem mesmo um crime. A Operação Lava Jato, entretanto, tenta enquadrar as condutas nebulosas como crime de corrupção, o que, entretanto, pode não se confirmar, a não ser se a gente considerar que qualquer presente será necessariamente corrupção.

Mas essa conclusão – todo presente é corrupção –, embora possa até ser correta, implicaria na criminalização de muitas condutas que poderiam ser consideradas aceitas pela legislação. Como interpretar a doação de recursos para campanhas eleitorais? O compromisso de um eleitor com seu candidato implica necessariamente em uma troca? Mais ainda: como interpretar as doações, permitidas até 2014, de empresas que doavam mais de R$ 10 milhões para campanhas eleitorais à Presidência, como ocorreu com Aécio e Dilma? Seria bondade ou compromisso ideológico dos doadores, ou flagrante mecanismo de troca entre empresários e futuras autoridades?

Acredito que as doações de pessoas físicas a campanhas possam não ser necessariamente um mecanismo de troca, mas as doações empresariais não me parecem outra coisa. Mas isso significa que a conduta não fica restrita ao exemplo de Lula, mas sim a toda uma estrutura política alimentada por interesses empresariais privados. Por isso, a concentração dessa acusação apenas no ex-presidente Lula parece uma indignação bastante seletiva.

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