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bruno meirinho

Curitiba para poucos

Na última quinta-feira, o prefeito Gustavo Fruet sancionou o projeto de lei do Plano Diretor, incorporando mais de 100 aprovadas pelos vereadores, com quatro vetos. O resultado final, embora não possa ser considerado bom, “é o que tem para hoje”, o máximo que se pode esperar da cidade refém de um órgão de planejamento apático.

A lei do Plano Diretor, que ganhou o número 14.771/2015, é insuficiente para enfrentar a realidade urbana. Não inova e não planeja. É um plano sem sul, sem norte. E a principal responsabilidade por esse desacerto é do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc).

Diante da necessidade de elaborar a revisão da versão de 2004 do Plano Diretor de Curitiba – obrigatória por lei, já que a revisão anterior completava dez anos em 2014, o prefeito Gustavo Fruet delegou ao Ippuc a atribuição de conduzir os trabalhos. O encaminhamento é incorreto, já que a condução dos trabalhos deveria ser do Conselho da Cidade de Curitiba (Concitiba), com participação popular, sendo que o Ippuc, um órgão de assessoramento técnico, deveria oferecer apoio às discussões do Concitiba, e não substituí-lo.

A principal responsabilidade pelo desacerto do Plano Diretor é do Ippuc

Com as tarefas concentradas na cúpula do órgão de pesquisa e planejamento urbano, a participação popular foi limitada. O Ippuc fala em centenas de reuniões, oficinas e audiências, mas deve-se frisar que a metodologia dessas reuniões não favorecia a participação popular, e foi decidida de forma unilateral.

Além disso, a coordenação da revisão do plano diretor escondeu o jogo durante todo o processo, já que não apresentava as propostas da prefeitura ou do Ippuc para o Plano Diretor, tornando a participação popular um jogo desigual no qual a sociedade discutia em torno de uma proposta desconhecida.

Se ainda fosse para permitir uma postura mais acolhedora das sugestões da sociedade, poderia ser louvável. Mas, na verdade, muito pouco do que a sociedade sugeriu foi acolhido. Assim, quase toda a proposta final do Plano Diretor foi elaborada em gabinetes do Ippuc, com limitada chance de posição crítica pela participação popular.

Encaminhada à Câmara, a proposta de revisão do Plano Diretor recebeu mais de 200 emendas dos vereadores. Inevitável, diante da distância da proposta original em relação à realidade. A população reivindicou alterações e teve mais condições de participar da discussão dentro da Câmara.

Nesse contexto, movimentos populares como a Frente Mobiliza Curitiba, uma frente de movimentos sociais que elaborou propostas em defesa de um Plano Diretor mais democrático, conseguiram vitórias pontuais, como a previsão do bilhete único no transporte coletivo e da regularização fundiária e de edificações, ainda que aprovadas na forma de diretrizes gerais. Outras propostas de grande importância foram rejeitadas pelos vereadores, como as exigências de mais transparência e participação popular.

Mas a revisão do Plano Diretor poderia ter resultados muito melhores que esses. Se o Ippuc permitisse uma discussão franca a respeito das diretrizes da cidade, os grandes projetos de intervenções estruturantes, como o metrô e a Linha Verde, poderiam ter sido discutidos. Além disso, o enfrentamento às desigualdades sociais e as políticas para o desenvolvimento econômico também não ficariam limitadas a notas de rodapé.

A verdade é que existe uma escolha deliberada para esvaziar o planejamento da cidade. Para a prefeitura e os especuladores, o Plano Diretor é mera estética. O que importam são os projetos específicos, realizados sem participação popular e com grandes benefícios privados.

Ora, no mesmo dia em que o prefeito sancionou a lei do Plano Diretor, também aprovou as alterações na operação urbana da Linha Verde, na forma da Lei 14.773/2015. As alterações aprovadas permitem melhores condições de projetos imobiliários na Linha Verde, para atrair investimentos.

Entretanto, a despeito de melhorar os resultados imobiliários, a proposta da operação urbana ainda não prevê um programa de atendimento econômico e social para a população diretamente afetada, conteúdo exigido pelo Plano Diretor. A falta de um programa dessa natureza é desastrosa, já que a criação de tantos incentivos imobiliários em uma região extensa como a Linha Verde tem intensificado conflitos sociais que têm sido ignorados pela prefeitura.

E assim segue o planejamento urbano da cidade: o Plano Diretor, de caráter básico e de direção de toda a política urbana para o benefício de todos, permanece vazio, sem aplicabilidade. Enquanto isso, projetos específicos de favorecimento de poucos são executados sem as contrapartidas necessárias.

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