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Tenho um amigo que está bem de vida, bem de saúde, bem até no amor. Mas quan­do se olha para ele, nota-se que não é feliz, pa­­rece trazer um crime abo­­minável dentro de si

Moreno forte, mais para baixinho, olhos escuros e vivos, cabelos cacheados. Mora com os pais, que são descendentes de suecos altos, louros, cabelos lisos e olhos azuis.

O rapaz nunca perguntou a razão de tal diferença. Os outros também, por caridade ou gentileza. A irmã mais velha, que é alta, loura e de olhos azuis, quando está aborrecida com ele, diz que os pais o encontraram numa lata do lixo. Penalizados, o levaram para casa, trataram os papéis no Juizado de Menores e o adotaram como filho. Quando está muito triste, ele até acredita um pouco nessa história.

Dia desses, o pai pediu-lhe que fosse apanhar um recibo antigo numa velha pasta. Procurando entre os papéis, ele viu o recorte amarelecido de um jornal.

Estarrecido, leu que, justamente no ano em que nascera, um bebê fora raptado por duas ciganas, que deixaram no berço outra criança. Seria ele? Por que o pai guardava há tanto tempo aquele recorte de jornal? Por que saíra tão diferente dos pais e da irmã?

Durante alguns dias, viveu longas noites de angústia. Teve vontade de perguntar o que realmente acontecera. Mas dificilmente lhe diriam a verdade. Além do mais, faltou-lhe coragem. De qualquer forma, depois de avaliar a sua situação, assumiu a alternativa. Nunca perdeu seu ar triste, mas encontrou uma solução que em parte o redimiu. Talvez as ciganas o tivessem trocado por outro bebê – essas coisas aconteciam no tempo em que nasceu, crianças eram roubadas ou trocadas. Mas não fora apanhado na lata do lixo. O fato de ele não ser ele era mais dos outros do que seu.

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