Rio de Janeiro Trabalho em jornal há bastante tempo. Muitos dos cacoetes da profissão absorvi, mas sempre sobram algumas deformações profissionais que não descem pela garganta.
Uma delas já contei em crônica passada é a proibição da palavra "câncer": já foi proibida nos jornais brasileiros. Outro cacoete que não desce é a discriminação dos jornais em certos casos policiais. Se um favelado toma umas e outras e esfaqueia a mulher, ou se uma favelada, enlouquecida pelo ciúme ou pela bebedeira do marido, dá um tiro no cujo o fato é narrado com todos os detalhes: fica-se sabendo quantas amantes o cujo tinha, ou quantas vezes batia na mulher, ou quantas garrafas bebia.
Já o negócio é outro quando o mesmo incidente trágico, lamentável, mas próprio da condição humana acontece com o pessoal da sociedade, das finanças, da política ou da classe artística.
Tenho anos na profissão e sei como essas coisas acontecem: pressões de amigos, às vezes de anunciantes e, às vezes, pressão nenhuma, apenas a rotina de excetuar os políticos, empresários e artistas das misérias da condição humana, deixando facadas e tiros para os favelados, os alagados, os humilhados e ofendidos da vida.
Há tempos, um ex-ministro foi esfaqueado pela amante. Os jornais era tempo de ditadura apresentaram o fato como se fosse um assalto, o ex-ministro estaria se dirigindo para o carro quando um assaltante surgiu à sua frente e o esfaqueou.
Todo mundo sabia de tudo, e a mentira oficial, através da imprensa, não colou. Acredito que os jornais não precisam mais dessa subserviência ao poder, ao talento, ao dinheiro.