Se o Supremo Tribunal Federal, ocupando o vácuo legislativo, se preocupa com o uso das algemas, nada demais que a mídia se interesse pela palpitante questão do cardápio servido a um banqueiro que está na prisão esperando julgamento.
Destino estranho o das lagostas e do Brasil. Ia havendo uma guerra por causa delas, os franceses não chegaram a brigar, mas um deles, o general De Gaulle, teria dito que não somos um país sério. Tudo por culpa das mesmas.
Não vejo nada demais no fato de um prisioneiro receber, nos dias de visita, um reforço de calorias e proteínas vindo de fora, trazido por parentes, amigos ou adquirido com pecúnia própria dentro das normas que regulam a questão.
Numa das prisões que cumpri (1965), em companhia de amigos (a maioria já se foi da enxovia deste mundo), passei muito bem de boca. Dona Lúcia, mãe do Glauber Rocha, preocupada com o filho que estava na mesma cela, mandava uns frangos que ela preparava com amor, frangos dourados, suntuosos, e em quantidade bastante para a fome de todos.
Posso me esquecer de tudo na vida, menos do sabor daqueles frangos macios, perfumados com a arte da Bahia de todos os temperos e cheiros. Na primeira visita que tivemos, Márcio Moreira Alves recebeu generosa provisão de queijos franceses que uma comissária da Air France, sua parenta, havia trazido naquele dia. Foi um banquete de frangos e queijos, embora sem vinho, apenas com a água da bica do quartel da Polícia Militar.
Tal como agora, no caso das lagostas do Cacciola, a mídia reclamou daquilo que um coronel chamou de farra gustativa. Mas os regulamentos estavam sendo cumpridos, ao menos nos primeiros anos de repressão militar. Pouco depois, as coisas mudaram.