Periodicamente aparece um personagem público que se destaca pela capacidade de dar palpites sobre qualquer assunto. A mídia tem um faro especial para desencavar esses caras, que são procurados para dar nome às coisas, sejam quais forem, como novo Adão, que, segundo a lenda, a pedido do Criador, deu nome às árvores, às galinhas e às nuvens.
Durante anos, pelos menos até o advento do movimento militar de 64, que o baniu do noticiário, dom Hélder Câmara era o Adão preferencial. Dava palpite sobre tudo, desde concurso de misses e seleção nacional a problemas de trânsito, filosofia quântica e caça às baleias.
O Adão que atualmente nomeia as coisas é Gilmar Mendes, procurado sobre qualquer assunto, inclusive os de sua especialidade, pois se trata de um juiz na alta esfera do Supremo Tribunal. Creio que não lhe faltem conhecimentos técnicos, embora lhe falte a conveniência de certas declarações que equivalem a um prejulgamento.
Como se sabe, um juiz, da primeira à última corte, só pode se manifestar nos autos de um processo. Se acaso tem algum comprometimento anterior com uma das partes, deve se declarar impedido naquela ação, uma vez que já formou e divulgou opinião antecipada sobre a matéria antes de ser instaurado o processo judicial.
Um juiz, de qualquer instância, pode ter e expressar opiniões sobre a previsão de chuvas, os destinos finais das novelas da TV, o legado cultural de John Lennon, o local onde estão enterrados os ossos de Dana de Teffé. São enigmas que dificilmente formarão matéria de direito.
O atual presidente do STF antecipa publicamente juízos sobre problemas que, mais cedo ou mais tarde, poderão entrar na pauta daquela corte de justiça. Nesses casos, pode ser acusado de suspeição.
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