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Na virada do ano 2000, a Rede Globo fez uma enquete para saber qual teria sido a música popular mais importante do século 20. Deu "Aquarela do Brasil" na cabeça, votação que só não foi unânime porque um dos questionados votou em outra. Na ocasião, acompanhei a maioria, mas, em segundo lugar, por gosto estritamente pessoal, coloquei "Dora", de Dorival Caymmi.

Não tenho certeza, mas acho que, para a medalha de prata, a citada maioria dividiu-se entre o "Carinhoso", de Pixinguinha, e "Asa Branca", de Luiz Gonzaga.

Fiquei mesmo com a rainha do frevo e do maracatu, maravilhosa incursão de Caymmi ao Recife dos rios cortados de pontes, do bairro das fontes coloniais. Difícil escolher uma entre as obras-primas de sua produção. Para todos os efeitos, ele ficará como o cantor da Bahia, de seu mar e de suas jangadas, de suas baianas e de seus acarajés.

"Os clarins da banda militar tocam para anunciar: sua Dora agora vai passar, venham ver o que é bom..." – um quadro dos melhores de nossa história, com um pouco de Manuel Bandeira.

A musicalidade de Caymmi era estonteante, sempre me impressionou. Estava fincada no cancioneiro popular, mas tinha raízes em clássicos, como Grieg, que ele próprio admitia como uma de suas influências. Neste particular, "O Mar" é totalmente Grieg e só remotamente lembra Debussy.

No final dos anos 50, Caymmi gravou um vinil com Ary Barroso, um interpretando composições do outro; Ary ao piano, e Caymmi com a voz, o violão e aquele jeito de respirar que era só dele. No final de "Tu", ele improvisa um largo trecho com a boca fechada. O próprio Ary reconheceu que o improviso de Caymmi era o melhor de todo o disco e confessou: "Eu não sabia que havia feito uma música tão bonita".

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