Não tinha noção de tempo, mas calculava que devia ser tarde. As ruas estavam desertas, o temporal provocara defeitos na iluminação, tudo estava escuro, ruas e casas, escuro ele próprio, sombra de si mesmo.

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E de repente a surpresa: encontrou a igreja iluminada e aberta, vazando luz pelas portas, pelos vitrais coloridos da nave central. No meio da escuridão, encharcada de noite, lavada pelo temporal, a igreja era uma lanterna gigantesca, branca – e aberta.

Entrou. Reconheceu as colunas, a gruta de pedras servindo de altar-mor. Ali rezara a primeira missa, dera comunhão a seus pais. Ali tivera o primeiro ataque, rolara pelos degraus de mármore, sujando os paramentos brancos com o sangue do vinho consagrado que se misturou ao próprio sangue.

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À direita, o batistério. A luz era forte, os lampadários estavam acesos, tudo parecia pronto para um rito solene, liturgia triunfal, missa definitiva. Ele sabia que no batistério havia o vitral. O pai o mandara fazer quando padre Thiago iniciara a construção da igreja.

Sim, a igreja tinha a sua idade e ela agora o recebia em seu ventre macio, iluminado e vazio, recolhendo-o do mundo, abrigando-o do temporal. Lá estava o vitral, berrante nos vermelhos e azuis, o Batista batizando o filho de Deus, o Rio Jordão correndo mansinho. No alto, a pomba do Espírito Santo flutuando entre raios dourados.

Na parte de baixo, entre as ondas do rio, a inscrição que o pai mandara colocar: "Este batistério foi inaugurado em 23 de dezembro de 1930, quando o inocente Mateus tornou-se cristão pela graça de Deus".

O inocente Mateus crescera, fizera-se padre, ouvira pecados e pecara. Transformara-se nele mesmo: farrapo molhado de chuva. Ele, o inocente Mateus, está de volta.