Confesso não gostar de falar ao telefone. Tenho verdadeira aversão. E por um desses dilemas da vida (e como essa danada tem dilemas), optei por uma profissão que me obriga a ficar boa parte do expediente pendurado na invenção de Graham Bell. E pago caro por isso.
Para render essas mal ditas letrinhas (eu disse mal ditas, não malditas vamos ressaltar esse espacinho aí, moçada!) publicadas por este escriba de faixa branca no quimono, sou assediado diariamente por uma dor no ombro. Mais especificamente no esquerdo, onde acomodo o telefone enquanto faço anotações nos bloquinhos de papel para as entrevistas. E é ali, no meu ombro esquerdo, que a dor chora suas mágoas. Chora de soluçar. Chora de doer e jogue para bem longe qualquer tipo de trocadilho.
Consta no RG da dita-cuja o nome Inflamação de Tendão. Mas o ortopedista muito do meu chapa , deixou essas formalidades de lado ao nos apresentar. Lascou o apelido da moçoila pra que pegássemos logo intimidade: "Tendinite, Marcos; Marcos, Tendinite". Muito praz... digo, nenhum prazer! E é melhor mesmo nos pouparmos dessas frivolidades. Até porque minha relação com ela é bastante intensa, quase um namoro. Com a dona Tendinite no papel de a chata castradora do relacionamento. Óbvio!
Agora a imprensa é sempre culpa dos jornalistas! me presta um favor enorme ao informar que os fuxicos alheios podem estar sendo ouvidos por bisbilhoteiros de plantão. Tudo feito nessas engenhocas, os tais dos grampos telefônicos. E não é de qualquer bisbilhoteiro que estamos falando não, meu caro. Gente grande. Gente graúda. Gente que não come mel: mastiga abelha.
E eu que pensava que o único serviço telefônico prestado pela polícia brasileira fosse aquela famosa técnica de tirar cerume do ouvido da rapaziada das celas. Afinal, como é que alguém em uma sala escura pode escutar bem as gentis perguntas dos policiais e confessar com riqueza de detalhes o crime (se cometeu ou não, são outros quinhentos não me venha com detalhes, oras, bolas) se não ouve direito?
Só sei que, se antes eu já não nutria muita paixão por uma conversinha ao telefone, agora, com o risco de ser ouvido por essa gente, é que falo menos ainda. E, se falo, redobro, triplico, quadruplico o cuidado.
Pois de mim, tenham certeza, eles não vão arrancar nada. Nada além do canto desse emplastro Sabiá que não pára de piar aqui no meu ombro esquerdo...
Marcos Xavier Vicente é jornalista e autor do blog Populares www.gazetadopovo.com.br/blog/populares