Quando convidado para ministro da Cultura, ainda no primeiro governo de Lula, o cantor e compositor Gilberto Gil levantou a premissa: não podia aceitar um cargo que conflitaria com sua vida profissional, que exigiria deslocamentos não compatíveis com uma função que deveria ser exercida em regime de tempo integral.
O presidente compreendeu a questão levantada honestamente pelo artista e confirmou o convite, que afinal foi aceito. No segundo governo, Lula manteve o ministro que enfrentava o problema das verbas insuficientes para rodar a máquina oficial destinada a criar e desenvolver atos de cultura.
Não deixava de ser uma situação estranha. Um funcionário graduado do governo brasileiro em freqüentes turnês artísticas pelo mundo afora. Difícil conciliar as duas funções, sobretudo num ministério sem verbas e incentivo oficial. Na realidade, apesar de seu jogo de cintura pessoal e sua habilidade política, Gil era criticado pela situação e pela oposição, que cobrava dele uma presença física no organograma da vida pública.
Para Gil, foi fácil repetir o acadêmico Eduardo Portella, que ao deixar o Ministério da Educação declarou que não era ministro mas estava ministro. Lembro um exemplo antigo: ao ser nomeado prefeito de Belo Horizonte, o médico Juscelino Kubitschek avisou ao governador que o nomeara sua intenção de continuar dando expediente no seu consultório e num hospital. Na parte da manhã vestia o avental, clinicava e operava. Na parte da tarde, cuidava da cidade criando metas de trabalho.
Não deu para manter o esquema por muito tempo. O volume das obras o exigia, despiu o avental para nunca mais vesti-lo. Sua vocação era a administração. A vocação de Gilberto é outra.
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