Ênio Silveira, Jorge Zahar e Paulo Francis sabiam o que era o tempo e viveram dentro dele o que foi possível. Mas evitavam defini-lo: bastava o tempo em si

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"Eu sei o que é o tempo. Mas se me pedirem para dizer o que é o tempo, não saberei dizê-lo". A citação (de memória) é de Santo Agostinho, um dos pensadores mais admirados e citados a partir da segunda metade do século 20. Gênio em todos os sentidos, na vida e na obra.

Mas não é dele que vou lembrar, além da citação inicial. É mesmo sobre o tempo que a gente perde, desperdiça, mata e acaba nos matando. E antes de matar, nos mutila de uma forma ou outra.

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Foi nisso que pensei mexendo numa caixa com algumas fotos antigas. De repente, na mesa de um restaurante que não identifiquei, quatro amigos estão sorrindo entre si: Ênio Silveira, Jorge Zahar, Paulo Francis e o autor destas mal traçadas linhas. Dois editores, um jornalista de sucesso e um cara que ainda acreditava em alguma coisa, inclusive nele mesmo.

Ênio e Jorge deixaram um legado maravilhoso no mercado editorial. E uma referência obrigatória no afeto de todos os que conviveram com eles. Ênio foi o primeiro a morrer. Meses depois, em Paris, Jorge me confessou que andava triste, sentindo falta do amigo de toda uma vida: o tempo dele custava a passar. Ao adoecer, Paulo Francis veio especialmente de Nova Iorque para visitá-lo, passava o dia com ele, à noite saíamos para jantar em algum lugar, a última vez foi em minha casa.

Paulo também foi embora, declarava-se tecnicamente morto. Eu desconfiava que era a falta dos dois amigos – e acho que desconfiei certo. Os três, Ênio, Jorge e Paulo, sabiam o que era o tempo e viveram dentro dele o que foi possível. Mas evitavam defini-lo: bastava o tempo em si.

Tempo que deixou de ser tempo quando, um após outro, como Cristo diante de Pilatos, descobriram que não eram deste mundo.