Tinha de acontecer comigo. Em ida banal a uma repartição para revalidar um documento, preenchi um cadastro que me exigia a filiação. Nunca tive problemas nesse quesito. Escrevi o nome dos meus pais como sempre os escrevi. O funcionário que me atendeu tirou de uma pasta um outro documento e engrossou:
"Nesta certidão aqui, o nome da senhora sua mãe é Morais, com "i". O senhor declara agora que a senhora sua mãe é Moraes, com "e". Afinal, de quem o senhor é filho?"
Respondi um pouco insultado: "De Julieta de Moraes Cony. Ou de Julieta de Morais Cony. Para mim, sempre deu na mesma".
"Para o senhor, sim, mas para o Estado, não. Há que decidirmos de quem o senhor é realmente filho para que o documento possa seguir o trâmite legal."
Já tive crises ontológicas a meu respeito e a respeito da humanidade. Quem somos, de onde viemos, para onde vamos, o que estamos fazendo neste mundo etc. Esta me pegou desprevenido, no contrapé. Passei a vida inteira julgando-me filho de minha mãe, de um velho tronco familiar de Três Rios, no norte fluminense.
De repente, o mundo desaba sobre mim. Não posso provar que sou filho de uma Moraes ou de uma Morais. É como se não fosse filho de mãe alguma, nasci de uma proveta que nem existia no tempo em que vim ao mundo.
Outro dia, relendo Machado de Assis, em homenagem ao badalado centenário de sua morte, dei com aquele político que fez um discurso na Câmara e os anais daquela sessão registraram sua fala trocando a palavra "dúvida" por "dívida".
O sujeito queria destruir o mundo por causa de um "i" no lugar de um "u". Ameaçou derrubar o governo, acabar com as instituições. Eu não cheguei a tanto, mas confio no novo acordo ortográfico, que me dará a mãe que não tive.
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