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Carlos Ramalhete

A crise policial brasileira

A situação da segurança pública no Brasil é tão absurda que temos uma Torre Gêmea de homicídios por semana, num país que não está em guerra. Ao apontar as causas do problema, todavia, cada grupo de pressão foca apenas o que cabe em sua narrativa de propaganda: armas demais ou armas de menos, polícia amarrada ou polícia assassina etc.

Comparando a polícia brasileira dos anos 1950 às polícias europeias em que sua estrutura se inspira, encontramos uma situação muito parecida nos dois lados do Atlântico. De lá para cá, todavia, as polícias de além-mar civilizaram-se sem perder, como as nossas, o controle da violência urbana. A diferença é que nossos governos militares não reorganizaram técnico-cientificamente o trabalho policial, como foi feito na Europa na mesma época e frequentemente sob pressões semelhantes. Afinal, o problema do terrorismo também era presente na Europa nos anos 1970, ainda que os terroristas deles fossem mais eficientes que os nossos.

Quem nasce para VAR-Palmares não chega a Baader-Meinhof

Os europeus passaram de uma “investigação” baseada em pancadaria e delação a uma investigação científica real, mas no Brasil isso não ocorreu. Tudo estava em posição para que isto fosse feito, inclusive um controle inaudito da polícia pelas Forças Armadas, que possibilitaria a estas implantar necessárias mudanças sistêmicas. O que ocorreu foi o oposto, contudo: os militares envolvidos na investigação do terrorismo transformaram-se em policiais clássicos, dando “um pau nas piranhas lá fora; vocês vão ver, elas vão ter que entregar”, como canta o clássico da MPB. Afinal, isso funcionava: um terrorista brasileiro preso logo entregava dezenas de outros, ao contrário de seus equivalentes europeus. Quem nasce para VAR-Palmares não chega a Baader-Meinhof.

A chance perdida não voltou mais, e a ascensão ao poder dos que pouco antes estiveram apanhando nos porões das delegacias garantiu que cabeças frias não prevalecessem. Piorando ainda mais a situação, as polícias americanas – em nada semelhantes às nossas – sofreram uma mudança problemática coetânea à redemocratização do Brasil. Com o recrudescimento reaganiano da “guerra às drogas”, as polícias personalistas e amistosas da tradição anglo-saxã mutaram-se em forças paramilitares, revoltando a esquerda americana. Nossos governantes, traumatizados por seus encontros com a polícia, assimilaram o discurso de protesto sem perceber que são situações completamente díspares, e passaram a ler por esse prisma delirante a ação policial brasileira.

Assim, os procedimentos “investigatórios” tradicionais foram coibidos ferozmente, cessando a punição tradicional dos criminosos, sem que nada fosse posto em seu lugar. O Estado tornou-se o protetor dos piores predadores antissociais.

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