O brasileiro tem o hábito de sonhar, sonhar alto e bonito, e muitas vezes acaba se esquecendo de que há uma dura realidade lá embaixo a esperar que caia. A questão da educação, por exemplo, é tratada num mundo ideal que qualquer pessoa que já tenha passado pela escola brasileira – teoricamente, todo mundo – deveria ser capaz de perceber que não tem lá muito a ver com a realidade.
O primeiro delírio é achar que a escola brasileira ensina. Daí vêm coisas como o desejo de enfiar Filosofia e Sociologia no ensino médio, de ter aulas de Química e Matemática avançada. Ora, ninguém aprende nada ali. As próprias faculdades das áreas que seriam ensinadas na escola têm sempre classes remediais para os novos alunos aprenderem o que em tese já saberiam. Não adianta querer ter mais e mais matérias, se elas entram por uma orelha e saem pela outra. Mesmo os bons alunos de Física, por exemplo, são normalmente incapazes de usar o que aprenderam na vida real. Na verdade, é comum que os melhores nem sequer se deem conta de usos reais daquilo.
O problema não é a falta de tempo trancado na escola; escola não é cadeia nem concentração de futebol
O segundo delírio é achar que os professores brasileiros são todos gênios dedicados e explorados por um sistema malvado que não lhes dá a verba necessária para que façam as escolas funcionar. Só para começar, segundo dados de uma pesquisa feita este ano em vista do Indicador de Analfabetismo Funcional, apenas 16% dos que trabalham na área de educação têm alto nível de alfabetização. Eu diria que há uns 10% de verdadeiros vocacionados, que ganhariam um dinheirão lá fora, mas estão na sala de aula. Já uns 40% estão lá para simplesmente repetir aquilo por que passaram na escola; são os que, por exemplo, viraram professores de Literatura sem jamais terem desenvolvido o próprio gosto pela leitura. E os últimos 50% não têm vocação, não se interessam genuinamente por aquilo e até fazem da cátedra palanque político.
Em grande parte, este fenômeno é devido à absurda exigência de diplomas altamente específicos, restringindo a oferta de mestres. Quando a isso se soma a estabilidade dos concursados, o inferno didático está montado. Dizem que essa reserva de mercado vai acabar; espero que seja verdade.
Finalmente, o terceiro delírio é achar que o problema da escola brasileira é falta de tempo com os alunos. Já aumentaram de 180 para 200 dias o ano letivo, e parece que querem aumentar ainda mais. Ora, os alunos aprenderiam muito melhor se cada turma de 30 alunos fosse dividida em turmas de dez alunos tendo aula um dia em cada três, por exemplo. O problema não é a falta de tempo trancado na escola; escola não é cadeia nem concentração de futebol.
Precisamos de uma reforma urgente.
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