A palavra "natural", no discurso político-social de hoje em dia, parece ter tantos sentidos quantos são os falantes. Para os ambientalistas, é "natural" o que não tem aditivos manufaturados, como uma fruta sem pesticida. Para os naturalistas, é "natural" o que pode ocorrer sem coerção, como o incesto entre os cachorros.

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No sentido aristotélico do termo, contudo, introduzido no discurso político sem que se perceba muito bem do que se trata, "natural" é aquilo que leva algo à perfeição de sua natureza. Assim, é natural ao homem casar-se e ter filhos, mas não é natural matá-los, ainda que haja quem o faça sem ser coagido. Tampouco, evidentemente, é natural confundir o sistema digestivo com o reprodutivo.

Essa confusão terminológica piora quando a valorização implícita no termo aristotélico é aplicada ao naturalista ("sem coerção"). O que ocorre sem coerção – e, portanto, para o naturalista, seria moralmente neutro – passa a ser necessariamente bom, digno de ser festejado, causa de orgulho, como se não ser coagido fosse o mesmo que atingir a perfeição da natureza. O prazer imediatista, objetivo de qualquer bicho, passa a ser uma vitória a celebrar.

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Ao mesmo tempo, todavia, a percepção do valor da pessoa passa a ser proporcional à sua capacidade de ação voluntária. A vida do bebê na barriga da mãe, como a do idoso doente na cama de hospital, passa a estar em risco; afinal, eles não são capazes de concordar ou discordar. Assim como os deficientes físicos e mentais, eles não são capazes de agir sem auxílio ou coerção.

É tênue, no entanto, a fronteira entre agir sem coerção e ser forte o bastante para coagir o próximo sem por ele ser coagido. Por enquanto esse orgulho da força boçal se restringe – já sem punição – aos assaltantes, estupradores e quetais. Em termos de sociedade, porém, a tendência é sua generalização, como em qualquer sociedade não cristã; o nazismo e o comunismo foram experiências genocidas da mesma descristianização social ora em curso de maneira mais sutil.

Quando se deixa de valorizar a natureza humana em prol de algo a ela contingente – a vontade, o desejo, a beleza, a juventude... –, o que se está fazendo, em última instância, é tornar totalmente arbitrário o sistema de valores. Se hoje a aquiescência é um bem, amanhã ela pode não o ser. Sem a percepção cristã do valor da natureza humana, o respeito à vontade alheia é mera e desnecessária delicadeza.

Afinal, o leão não pergunta à cabra se ela quer ser abatida. Ele a abate, sem ser coagido. Naturalmente.

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