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Crack não é maconha

Um dos maiores problemas do Brasil é o descompasso entre a lei positiva e a moral vivida pela população. O que é condenado pela população é permitido pela lei, e o que a lei proíbe é muitas vezes considerado algo neutro, ou mesmo bom, pela população. Isso decorre do mundo de fantasia em que vivem os legisladores, que são isolados da realidade das ruas pela riqueza e proteção de que dispõem.

Hoje corremos o risco de ver mais uma loucura tornar-se lei, desta vez pela pena de juízes não eleitos que se arvoram em legisladores. O STF julgará nesta quinta se libera completamente o uso e porte de qualquer droga no país inteiro, contra os anseios da população e o próprio bom senso.

Multidões de pessoas consumidas pelo crack movem-se como zumbis pelas cidades. O que cometem não é mera autolesão

A fraca maconha recreativa de algumas décadas atrás – referência de “droga” para a maior parte dos formadores de opinião – está servindo de cavalo de Troia para a legalização completa de drogas pesadas perigosíssimas, como o crack que devasta tantas famílias no Brasil de hoje. A besteira vem da Defensoria Pública de São Paulo, que confundiu a defesa do próprio crime com seu dever de defesa de acusados desprovidos, levando ao Supremo a questão sobre se o usuário comete apenas uma autolesão, logo não criminosa.

Ora, só para começar, não se está falando apenas (ou nem sequer majoritariamente) de pessoas de classe média que fumam maconha como outros bebem uma cervejinha. Estes já estão fora do alcance da lei, na prática, há muito tempo. Afinal, a lei atual já não permite a prisão por porte de droga, apenas por tráfico, e o uso propriamente dito não é crime. A pior consequência penal possível para porte de droga é prestar serviços comunitários ou pagar uma cesta básica, além de ficar com o “nome sujo”.

Multidões de pessoas consumidas pelo crack, todavia, movem-se como zumbis pelas cidades, cometendo furtos (que tampouco são punidos com prisão hoje em dia) e roubos para conseguir dinheiro para comprar mais droga, num ciclo vicioso de embrutecimento em que as periódicas visitas à delegacia não são nem sequer percebidas como um verdadeiro incômodo. É dessas pessoas que a lei penal trata, na prática, pois são elas que lidam cotidianamente com a polícia.

O que cometem não é mera autolesão. Suas vítimas são a população, especialmente a mais pobre, que não tem carros blindados ou muros altos com cercas elétricas. São os pobres, que moram em casas com pouca segurança e transitam a pé e em coletivos, as vítimas preferenciais dos zumbis do crack. Dentre os pobres, preferencialmente as mulheres e as crianças. Dentre as mulheres, preferencialmente as mais idosas.

Espero, sem muita esperança, que o STF veja o que é uma cracolândia, e não mais a confunda com as reuniões animadas por um violão e maconha fraca dos anos 1970. Chega de absurdos.

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