Os antolhos ideológicos com que muitos se isolam da realidade chegam por vezes ao ridículo. Um dos fatos da vida mais inaceitáveis para os ideólogos de plantão é que Rousseau estava errado: o homem não é um ser bom, mas estragado pela sociedade. Ao contrário: entregue a si mesmo, sem a intermediação da sociedade e um intenso treinamento para postergar a saciação dos desejos, o homem é mau. É cruel, é egoísta – como o berro “meu!” das crianças pequenas demonstra –, é vaidoso.
Já há políticos bradando que as facas deveriam ser proibidas, como se o roubo e o assassinato já não o fossem
Dentre os homens, todavia, há alguns ainda piores. Alguns em que algo deu errado, um curto-circuito de algum tipo nos miolos, talvez, que nem mesmo o trabalho da sociedade – dos pais e professores ao guarda da esquina, passando pelo namorado da moça bonita e a dona do cachorrinho chato – consegue consertar. Há quem os chame psicopatas, há quem os chame sociopatas, e há quem simplesmente diga que são ruins, ruins como cobras.
Alguém ruim com um porrete na mão se sente fortíssimo, pronto a tomar dos outros o que crê ser seu de direito. Com uma caneta na mão, vê-se pronto para iludir velhinhas e tomar delas a pensão. Com um carro, estaciona na calçada e aposta corrida bêbado. Tudo é dele, ou tudo é para ele, e os outros são ou obstáculos no caminho ou ovelhas a tosquiar.
Um desses, apesar da pouca idade, ruim como poucas cobras sabem ser, apossou-se semana passada de uma bicicleta que sorria para ele, assassinando barbaramente a facadas o pobre médico que nela andava. Quando a polícia o identificou e foi à sua casa prendê-lo, achou lá várias outras bicicletas, cuidadosamente escolhidas pela marca para aumentar o lucro de cada roubo.
Aí chegaram em peso os ideólogos, apontando que ele era de família pobre e havia saído cedo da escola, sem se dar conta de que estavam arrastando na lama todas as famílias pobres e todos os autodidatas.
Os demagogos não tardaram a botar a culpa do assassinato no seu instrumento, e já há políticos bradando com aquela peculiar convicção que brota do exame minucioso das pesquisas do Ibope que as facas deveriam ser proibidas, como se o roubo e o assassinato já não o fossem.
São os antolhos da ideologia. Sem eles, seria evidente que se o rapaz houvesse sido educado nas melhores escolas teríamos simplesmente uma versão masculina da Suzane von Richthofen, não o anjinho de candura que se quer fazer crer que a combinação de carteira gorda com estudo da tabela periódica produziria por si só.
É para casos assim que existe a cadeia. Se nela ficam separados os menores dos maiores, tanto melhor, desde que ela exista e tire de circulação quem se percebe como predador, não como cidadão. A cadeia serve fundamentalmente para proteger os outros, não para tentar consertar gente ruim.
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