No evangelho deste Domingo um jovem rico se aproxima de Jesus e lhe faz esta pergunta: "Bom Mestre, o que devo fazer para conseguir a vida eterna? As palavras com as quais é formulada a pergunta revelam uma elevada sensibilidade espiritual. O jovem não fala de " conquistar, merecer, ter direito", mas de "herdar" a vida eterna. A herança não se ganha, não se recebe como prêmio, como remuneração por um trabalho, mas é dada gratuitamente. Como resposta Jesus o estimula a observar os mandamentos.
A resposta do jovem rico é surpreendente: causa-nos certo espanto que ele afirma com tanta convicção que observou todos os mandamentos desde a sua infância. Provavelmente ele também não estivesse isento de alguma falta; também ele poderá ter cometido alguns erros, como acontece com todos. O seu julgamento sereno e tranquilo, porém, deve servir para todos nós como inspiração para uma avaliação mais otimista, menos aflita e rigorosa da nossa vida. As falhas que cometemos não devem não impedir de considerar como aceitável no seu conjunto a nossa vida.
A angústia, a dramatização das próprias fraquezas, a sensação de recusa por parte de Deus, a autopunição por não sermos tão perfeitos como os anjos, não são sinais de santidade, mas de soberba. Não se pode classificar como bom o que é mau, é verdade, mas não podemos abusar da crueldade contra nós mesmos, para não corrermos o risco de praticá-la também em relação aos outros. Jesus, ao ouvir a resposta do jovem rico, " fixou nele o olhar e o amor". No jovem rico Ele fixa um olhar carinhoso, afetuoso, porque percebe que o seu coração está preparado para um voo mais alto e então lhe dirige um convite decisivo: "Vai, vende tudo o que tens e distribui aos pobres e terás um tesouro no céu; depois vem e segue-me". Não se trata de uma convocação para desprezar, ou, pior ainda, para destruir ou amaldiçoar os bens deste mundo, mas uma inspiração para usá-los de uma forma correta, para valorizá-los, e colocá-los no plano de Deus a serviço de quem se encontra necessitado.
Jesus não condena a riqueza, mas a ansiedade de acumular fortunas de forma gananciosa. O ideal do cristão não é a pobreza, a fome, a nudez, mas a divisão fraterna dos bens que Deus pôs à disposição de todos. Pecado não é ficar rico, mas ficar rico só para si. Encerra-se o episódio com a opção do jovem rico de continuar com os seus bens. Não tem a coragem de aceitar a proposta de Jesus, não confia não se anima a arriscar, tem medo de perder, afasta-se acabrunhado. Está angustiado porque não tem a coragem de desapegar-se dos bens. O homem foi criado à imagem de Deus e no seu coração sente uma irreprimível necessidade de infinito. Ainda que reprimido, silenciado, esquecido, este desejo ressurge e nenhuma criatura jamais conseguirá saciá-lo.
Que fim teve esse jovem rico? Tornou-se malvado e merecedor do inferno? Não! Continuou sendo um homem justo, honesto, religioso, bom, como era antes; faltou-lhe só a determinação de aceitar a lógica do Reino, de confiar na proposta de Jesus. Não levantou voo para as alturas. Quanto mais riquezas alguém possui, mais forte se az sentir a tentação de amarrar o próprio coração aos próprios tesouros, a ponto de se tornarem um obstáculo para quem pretende entrar no Reino dos céus.
Dom Moacyr José Vitti CSS é arcebispo metropolitano