Desde os tempos antigos a Quaresma foi considerada como um período de renovação da própria vida. As práticas a serem cumpridas eram, sobretudo três: a oração, a luta contra o mal e o jejum. A oração para pedir a Deus forças para converter-se e acreditar no Evangelho. A luta contra o mal para dominar as paixões e o egoísmo. Por fim, o jejum. Para seguir o Mestre o cristão deve ter a força de esquecer-se de si mesmo, de não pensar no próprio conforto, mas no bem do seu irmão. Assumir uma permanente atitude generosa e desinteressada é de fato difícil. Este é o jejum. Mas pode o sofrimento ser uma coisa boa? Como pode agradar a Deus a nossa dor? Não! Deus não quer que o homem sofra. Todavia, para ajudar o necessitado, é preciso muitas vezes renunciar àquilo que agrada e isto custa sacrifício.

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Não é o jejum em si que é bom (às vezes é feito por motivos que não tem nada a ver com religião: há quem se alimenta com parcimônia simplesmente para manter-se em boa forma física, para ser elegante, para estar com saúde). O que agrada a Deus é que, como alimento é que se consegue economizar com o jejum, se pode aliviar, pelo menos por um dia, a fome do irmão. Um livro muito antigo, muito lido pelos primeiros cristãos, o Pastor de Hermas, explica deste modo a ligação entre o jejum e a caridade. "Eis como deveis praticar o jejum: durante o dia de jejum tu comerás somente pão e água; depois calcularás quanto terias gasto para o teu alimento naquele dia e tu oferecerás esse dinheiro a uma viúva, a um órfão ou a um pobre; assim tu te privarás de alguma coisa para que o teu sacrifício seja útil para alguém, para poder alimentar-se. Ele rezará ao Senhor por ti.

Se tu jejuares desse modo, o teu sacrifício será agradável a Deus. Um famoso Papa dos primeiros tempos da Igreja, chamado Leão Magno, dizia numa Homilia: "Nós vos prescrevemos o jejum, lembrando-vos não só a abstinência, mas também as obras de misericórdia. Deste modo, o que tiverdes economizado nos gastos normais se transforme em alimento para os pobres. Todos os anos, no primeiro domingo da Quaresma, a liturgia nos leva a refletir sobre as tentações de Jesus. Mostra-nos o modo como o Mestre as enfrentou para nos indicar como nós também as podemos reconhecer e superar. Ao lermos a passagem de hoje (Lc 4,1-13), temos a impressão de que a experiência de Jesus não nos possa ser de muita valia: as suas tentações são muito diferentes das nossas, são surpreendentes, quase extravagantes.

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Quem dentre nós aceitaria atender às solicitações do demônio de prostrar-se diante do diabo (feio como ele é)? Quem lhe daria importância se propusesse transformar uma pedra em pão ou se nos convidasse a nos jogarmos do alto de uma janela? Não! AS nossas tentações são muito mais sérias mais difíceis de serem enfrentadas; além disso, não tem a duração de um dia, mas nos acompanham ao longo de toda a nossa vida. O Evangelho de hoje não é uma crônicas fiel,  redigida por uma testemunha ocular, do embate entre Jesus e o diabo. A narrativa constitui uma lição de catequese e quer ensinar-nos que Jesus foi submetido à prova não com três, mas "com todas as espécies de tentação", como declara expressamente o texto. Afirma-se que Jesus foi tentado em tudo como nós, com uma única diferença: Ele nunca foi vencido pelo pecado.

Dom Moacyr José Vitti CSS é arcebispo metropolitano