Passei nesta semana dando um curso de Ecologia da Restauração no meio do Semi-Árido nordestino e talvez tenha aprendido mais que meus alunos.
Eu vinha tentando há muitos anos contribuir para uma região do Brasil aonde pouca gente quer ir e menos ainda quer ficar. Sobram doutores no Sul e Sudeste enquanto faltam aqui. O que sobram por aqui são problemas.
A boa notícia que tive aqui não é tão nova, mas ainda assim é muito interessante. Os seres humanos ocupam o continente americano há muito, muito mais que 13 mil anos como acreditávamos anteriormente. E é possível que tenham vindo não pelo Estreito de Behring, como se pensava originalmente, mas pelo Atlântico mesmo.
Isso muda completamente as regras do jogo do manejo de ecossistemas. O Cerrado, por exemplo, que acreditávamos que fosse resultante de fogo espontâneo, passa com isso para o lugar de um ecossistema perturbado pelo fogo dos primeiros moradores de nosso continente.
Continuaremos usando fogo para recuperar Cerrado, então?
A outra notícia interessante é sobre a restauração da Caatinga. Muita gente acreditava (eu inclusive) que seria fácil restaurar um ecossistema com tanta sazonalidade, que ao longo de um ano seca e rebrota. Pois não é.
A seca e a rebrota da Caatinga é o que você vê acima do solo. O que há abaixo dele é um sistema radicular poderoso, desenvolvido ao longo de muitos anos e que é capaz de manter o fluxo de água para as plantas, mesmo com a pouca chuva daqui. Restaurar esse sistema radicular é o desafio e envolve o dilema de regar pouco e as plantas não crescerem, ou regar muito e as raízes não terem o estímulo para buscar água em níveis mais profundos. Estamos falando de irrigar áreas por quase uma década para conseguir o desenvolvimento necessário.
A outra notícia interessante, ainda que meio passada também, foi aprender que Euclides da Cunha passou somente dez dias no Nordeste. Voce pode achar, pelas 700 páginas de Os Sertões, que o homem passou uma vida aqui. Os Sertões é uma bela revisão de literatura, entremeada com uma ou outra experiência. Cunha é antepassado de nossos contemporâneos que constroem teorias inteiras sobre o NE, a partir de uma viagem de táxi no Recife.
Para terminar, caiu por terra também uma teoria minha igualmente superficial, de que o NE é um lugar barulhento. Levaram-me para comer uma galinha de capoeira e bode assado a uns quilômetros de Paulo Afonso, no mais perfeito silêncio, aliás com seus congêneres ainda vivos andando por ali. É uma experiência capaz de mudar ideias rápidas sobre o lugar. Há muita coisa boa para ser feita por aqui e vai ser muito bom ajudar.
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