Alguns produtores, que conseguiram se fazer ouvir através de alguns deputados estaduais, até que tentaram demover o governo do estado de colocar fim à insanidade que estava se transformando o plantio de soja sobre soja no Paraná. Não adiantou. Em nome do bom senso, da racionalidade e sanidade, a Secretaria Estadual da Agricultura (Seab), por meio da Agência de Defesa Agropecuária do Paraná (Adapar), decidiu proibir o plantio de soja safrinha, ou soja de segunda safra, a partir da temporada 2016/17.
Penso que deveria ter feito já a partir do ciclo atual, o 2015/16. Mas tudo bem. Pelo menos a decisão está tomada e a cadeia produtiva, mais do que se adaptar à nova realidade, terá que acatar a decisão. Além do que, proibir apenas a partir da próxima safra me parece uma atitude politicamente correta, estabelecendo assim um período de transição àqueles que possam sentir-se prejudicados. O cultivo na temporada atual será, portanto, tolerado. Importante esclarecer, no entanto, que os produtores continuam sujeitos a regras do vazio sanitário. Ou seja, o cultivo continua proibido entre junho e setembro.
Há tempos os pesquisadores alertam para o risco das safras seguidas, sem a devida rotação de culturas, em um ambiente que favorece a proliferação de pragas e doenças. A falta de manejo adequado também encurta o ciclo de vida e eficiência das tecnologias de controle e deixa a planta mais exposta e suscetível a ameaças como a ferrugem asiática, mosca branca, helicoverpa ou então à simples infestação de plantas daninhas. E os prejuízos são cada vez maiores, sejam eles financeiros, quando há possibilidade de controle, ou em rendimento, com expressiva queda na produtividade das lavouras.
E para aqueles que alegam a ineficiência de medidas como essa de maneira isolada, vale lembrar que em Mato Grosso e Goiás a soja de segunda safra foi proibida antes mesmo do Paraná. Concordo sobre a necessidade de proteção em bloco. Até porque as pragas e doenças se propagam de uma região para outra, de um estado para outro e até de um país para outro de várias maneiras. Pelo vento, na carga ou no pneu dos caminhões e até na sola do sapato. Mas alguém precisa começar, conscientizar e puxar a discussão para que um dia – espero que seja logo – o Brasil possa limitar o plantio da soja ao cultivo de verão.
No ciclo passado o Paraná tinha mais de 130 mil hectares de soja safrinha. Parece pouco perto dos mais de 30 milhões cultivados no verão. Porém, usando a mesma base de comparação, em oito anos a área de segunda safra da oleaginosa praticamente triplicou. No vizinho Paraguai, que se consolida como produtor e exportador de soja, a situação é ainda mais crítica. Na última safra o país cultivou quase 1 milhão de hectares de soja safrinha, o equivalente a 1/3 da extensão dedicada no verão.
É a mesma histórica da aftosa. Não adianta eu cuidar do meu rebanho, ou do meu quintal, se o vizinho não cuidar do dele. A diferença aqui são os mecanismos de vigilância sanitária. No caso da aftosa, o controle, por questionável e frágil que possa ser, está em toda uma estrutura de barreiras e fiscalização. Já em relação à soja, não há outra maneira de combate que não seja proibir o cultivo. E isso não tem a ver com a vontade deste ou daquele produtor, bem como não é uma decisão política. Cabe aqui uma decisão técnica, de interesse comum, do Estado e da população. O governo, portanto, fez o que devia fazer. E a agricultura agradece. Aqueles que hoje criticam, no futuro vão agradecer.
O campo
Grãos, carnes, frutas e cereais. Agroindústria, crédito e tecnologia. É diversificação, desenvolvimento, econômico e social. Nas três semanas que está na estrada, a Expedição Agricultura Familiar 2015, do Agronegócio Gazeta do Povo, desvenda uma nova realidade do campo, um recorte único e singular, recheado de histórias de vida, de dedicação, de condição e também qualidade de vida. É o pequeno produtor e a agricultura familiar, que longe de preconceitos e ideologias, se moderniza, adiciona valor à produção e ao campo, movimenta e torna-se fundamental às economias regionais. Em polos regionais como Santa Cruz (RS), Chapecó (SC) e Francisco Beltrão (PR), por exemplo, regiões por onde os técnicos e jornalistas da Expedição já passaram, é a produção do pequeno que faz girar o grande negócio das pequenas e grandes agroindústrias, nacionais e multinacionais.
O debate
Depois dos encontros realizados no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, nesta semana o Seminário Tendências da Agricultura Familiar no Século XXI chega a Francisco Beltrão (PR) e Campo Grande (MS), na quarta-feira e sexta-feira, respectivamente. Organizados pela Expedição Agricultura Familiar 2015, os eventos reúnem a cadeia produtiva e a sociedade organizada da região para fazer um diagnóstico e apontar tendências da agricultura familiar em aspectos econômicos e sociais da atividade.
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