Qual é a função de um sacerdote ou líder espiritual? Não me refiro aqui às atribuições eclesiásticas, pois estas dependem da religião, mas sim à função dessas pessoas na comunidade da qual fazem parte. Em geral, o que se espera deles é alento, conforto e orientação aos seus fiéis e seguidores, e uma vida exemplar e inspiradora. É uma tarefa das mais difíceis quando tomada com seriedade e honestidade; e justamente por isso juntar religião e política torna-se algo tão complicado.
Ora, o sacerdote ou líder que ingressa na política – tanto por meio de cargo eletivo como pela militância ativa junto aos agentes políticos – está fazendo uma escolha muito clara: a de deixar de cuidar de sua comunidade num nível micro para cuidar de assuntos comunitários em nível macro. Ao mesmo tempo, assumindo-se que a integridade e honestidade serão mantidas, a tarefa de servir de exemplo torna-se muito mais pesada, já que o escrutínio de sua vida não é mais feito por alguns poucos olhos locais, mas sim por toda uma população, seja ela de uma cidade, estado ou mesmo o país inteiro.
O que está em jogo é a liberdade e a segurança das pessoas
Nesses últimos dias, temos assistido às declarações estapafúrdias de dois líderes religiosos engajados na política sobre um assunto que não dominam: o armamento civil. Os pastores Silas Malafaia e Magno Malta – este, senador pelo estado do Espírito Santo; aquele, um evangelista de massas com um forte trânsito entre parlamentares da bancada evangélica – lançaram-se num ataque direto ao PL 3722 (aquele que reforma o Estatuto do Desarmamento), que foi aprovado pela comissão especial da Câmara dos Deputados na terça-feira passada. E o fizeram da pior forma possível: mentindo sobre o assunto. Não é possível saber o que os motivou a fazer suas declarações, mas é bastante provável que os esquemas de favores tão comuns na política brasileira sejam a razão por trás das mentiras. Afinal, como explicar que duas pessoas comumente engajadas em boas causas coloquem suas figuras públicas ao dispor de uma causa contrária à liberdade, um assunto altamente técnico em que não cabe o senso comum e nem os chavões da esquerda liberticida?
Ambos, em seus vídeos, dizem que o novo projeto de lei permitirá uma maior quantidade de armas e munições por pessoa, e que permitirá aos professores darem aulas com uma arma na cintura – afirmações muito distantes da realidade do texto do projeto. Ambos batem na tecla errada de que somente a força policial deve possuir e portar armas, como se a polícia fosse onisciente, onipotente e onipresente. Ambos tentam pintar um quadro de caos e guerra civil no caso de a população se armar, desprezando os fatos e a história: o Brasil era um país muito mais seguro quando a população possuía armas de fogo, e não há registros de países em que a implementação de leis de posse e porte de armas tenha causado aumento de criminalidade – muito pelo contrário. Ambos tentam associar o cristianismo e a paz ao desarmamento, quando a história mostra que os ditadores mais sanguinários foram justamente os que mais desarmaram populações. Ambos repetem a argumentação mentirosa que a esquerda costuma usar para combater o direito mais básico de um cidadão, o de defender sua integridade, sua vida e a de seus familiares. Ambos alinham-se aos que dizem combater, fazendo coro com a ala mais retrógrada da política brasileira.
Aos senhores Malafaia e Malta, fica meu pedido público: informem-se sobre o assunto e revejam suas posições. Sua influência sobre as pessoas é muito grande para que ajam de forma tão irresponsável com um tema importante como esse. O que está em jogo é a liberdade e a segurança das pessoas, as mesmas que não possuem a mínima condição de manter guarda-costas como os senhores mantêm, e que saem de suas casas todos os dias sob o peso de quase 60 mil assassinatos anuais neste Brasil em guerra.
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