Onde estávamos? Ah, sim, falava sobre o problema de se tomar a cultura apenas por uma noção antropológica e sociológica, sem qualquer valoração. Como, porém, valores são tão reais quanto o solo sobre o qual estamos, não valorar nada mais é do que, em verdade, valorar sem saber ou assumir que assim se faz. No caso dessa visão de cultura, um único valor acaba soberano: o da igualdade.
Todas as culturais são iguais, nenhuma é melhor, tudo se tolera, menos quem diga que uma cultura é melhor do que outra. Ou seja, é o reino da quantidade sem qualidade, ao que damos nomes como “multiculturalismo”, “relativismo cultural” e por aí vai. O mundo pode parecer muito odara assim, mas é só na cuca. No real, o império da igualdade é o da indiferença confusa.
Melhor do que explicar é demonstrar. Em 1916, surgiu no campo da arte o chamado dadaísmo. Segundo um dos seus precursores, Tristan Tzara, “Dada não significa nada”. O movimento tinha por finalidade negar todos os valores estéticos e artísticos então correntes, criando obras propositalmente sem sentido, incompreensíveis e frequentemente iconoclastas. O espécime mais conhecido é o urinol que Marcel Duchamp enviou para um concurso artístico, em 1917, apenas assinando como “R. Mutt” - nome da fábrica do urinol - e dando o título de “A Fonte”. A peça foi rejeitada por não ser considerada arte, mas o conceito vingou: em 2004, a peça foi considerada a obra de arte mais influente do século 20, pelo júri especializado do prestigiado Prêmio Turner.
Ou seja, qualquer coisa pode ser arte hoje em dia, basta o artista dizer ser. “O Pensador”, de Rodin, é igual “A Fonte”, de Duchamp. É por isso que, como demonstrei colunas atrás, qualquer um pode se confundir numa galeria de arte ou de exposições, considerando lixo o que seria arte e vice-versa, como no caso paradigmático do estudante da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) que levou um choque e ficou com a mão colada num poste próximo ao Centro de Artes e Comunicação (CAC), tendo convulsões e desmaiando, e as pessoas em volta aplaudiram a cena, pois não havia diferença dos “espetáculos” que por ali costumam acontecer. Indiferença confusa.
Quando vivemos pela igualdade, somente a igualdade, nada mais do que a igualdade, não temos defesa contra essa confusão e a indiferença se torna dessensibilização. Já não nos repugna o que é repugnável, como uma “performance” onde os “artistas” ficam enfiando o dedo no ânus uns dos outros. E ai de você se, caso sinta aversão, ouse expressar sua repulsa, pois aí o repugnante será você, taxado de preconceituoso, obtuso, “conservador” etc. O império da igualdade, quando consolidado, torna-se a única coisa “correta”, politicamente correta. O estágio final é torná-lo lei, impondo a todos a confusão como norma, penalizando quem “pense diferente”.
É o caso do funk no Brasil, com o projeto de lei nº 4.124/2008, proposto pelo dep. Chico Alencar, do PSOL/RJ, que o define como forma de manifestação cultural e determina que seja penalizado “qualquer tipo de discriminação, preconceito ou desrespeito, seja de natureza social, racial, cultural ou administrativo”. Por essa ótica, dizer que o funk contribui para uma “cultura do estupro” não seria possível, ainda que seja verdade. Em breve, serei um fora-da-lei por “pensar diferente” e ousar dizer em público. Aí, a única coisa a fazer será tocar um tango argentino.
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