Perdoe-me, caro leitor, mas serei chato. Quem não fica chato falando de decisões judiciais? Aliás, já confirmei a existência de enterro de anão, mas ainda não descobri quem, sem dever de ofício, tenha suportado assistir, na íntegra, uma dessas sessões de julgamento do STF. É um horror. Pose sobre pose sobre pose sobre pose, em linguagem empolada, tecnicamente chamada de firula.

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É o seguinte. Como todos sabemos, na semana passada, o ministro Teori Zavascki atendeu ao pedido de Fábio Porchat e afastou Eduardo Cunha do exercício do mandato de deputado e, por consequência, da presidência da Câmara dos Deputados, no que foi referendado por seus pares. Mas, por que só agora, se o pedido havia sido feito em dezembro de 2015? O próprio ministro respondeu em sua decisão:

Quando se quer, consegue-se ser célere, como o próprio STF demonstrou em outras ocasiões

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“(...) cumprindo registrar que o pedido foi formulado em dezembro de 2015, às vésperas do recesso do Judiciário e das férias forenses, de modo que o seu processamento somente pode ocorrer, de modo efetivo, a partir de fevereiro do corrente ano, quando se oportunizou ao requerido o exercício da defesa e do contraditório, na forma recomendada pela Constituição Federal. Ademais, uma sucessiva ocorrência de fatos supervenientes – registrados ao longo da presente decisão – determinou que apenas em data recente o pedido veio a ostentar as adequadas condições para ser apreciado, o que a seguir se faz.”

Que fatos supervenientes? Só no fim de sua decisão, lá pela pág. 63, ficamos sabendo. São dois. O primeiro, o fato de Eduardo Cunha ter se tornado réu em ação penal correndo no próprio STF, em 03 de março. O segundo, a instauração recente do processo de impeachment da presidente da República no Senado Federal, o que tornaria Eduardo Cunha o próximo, depois do vice-presidente, na linha de sucessão.

Deixa eu ver se entendi. Então, só quando se torna réu beirando virar presidente da República é que se tem “as adequadas condições para ser apreciado” pedido de afastamento de presidente da Câmara dos Deputados? Se for réu, mas “só” presidente da Câmara, não existiriam “as adequadas condições”? É evidente que a razão do afastamento é apenas a proteção do cargo da presidência da República, pois, se o fato dele ter se tornado réu fosse tão relevante, a decisão teria sido tomada junto com esta, ocorrida em 03 de março, pois o mesmo ministro foi o relator, apreciando quase todos os mesmos fatos. Ora, se o fundamento é quase igual, por que esperar dois meses para decidir o pedido de afastamento? Não me interessa aqui o acerto ou desacerto da decisão, mas sua demora em ser tomada. Justiça tarda é sempre falha, muito mais em casos de tamanha repercussão social.

Sei que estamos mais do que anestesiados com a lentidão do nosso Poder Judiciário, tratamos isso como algo normal, sabemos da realidade dos processos em excesso, da falta de estrutura, mas, os últimos meses vem mostrando que, quando se quer, consegue-se ser célere, como o próprio STF demonstrou em outras ocasiões. Não foi o caso desta vez, como de tantas outras. Depois se espantam que o povo não confie em “sua” Suprema Corte, como se viu constrangido o ministro Marco Aurélio, em entrevista recente, ao ouvir essa resposta de um de seus entrevistadores. Eu ri, mas é de chorar. Eu avisei que seria chato.

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