Ao pensar sobre o tema para a prosa semanal fiquei dividido entre dois assuntos que me chamaram a atenção ao longo dos últimos dias. Para não divagar e ao fim e ao cabo fazer as coisas devagar, decidi escrever sobre ambos os temas, embora não haja liga forte entre eles. A formalidade da página do jornal impõe uma elegância cerimoniosa, é verdade; porém o colóquio entre escritor e leitor pode ser suave, leve, sem perder a técnica e transitar por vários assuntos, da mesma maneira que se costuma fazer numa conversa presencial, quando pessoas falam sobre muitos temas de modo fragmentário e encerram o encontro com a sensação de que ainda há muito para conversar. A interlocução mobiliza o pensamento e faz brotar ideias, novas maneiras de ver e compreender o mundo.
As brigas entre torcidas de times de futebol na praça Eufrásio Correia e nos arredores do Estádio Upton Park em Londres aguçaram a minha preocupação com a Copa de 2014; fico imaginando o perigo de um jogo entre o Brasil e rivais históricos como Uruguai, Argentina. A isso se adicionam o trânsito inviabilizado, ladrões armados assaltando estrangeiros, cambistas. Talvez haja exagero nessa angústia e tenhamos um Woodstock do esporte: condições materiais adversas superadas por momentos mágicos de emoções favoráveis. Pode ser, pode não ser, eis a questão. No famoso festival de rock ocorrido em 1969, a chuva, lama, falta de comida e água, foram superadas pela intensa cooperação entre os jovens da plateia. A foto do casal abraçado, se cobrindo com um edredon sujo de barro, simbolizou a paz e o amor. Woodstock foi caso raro de dar certo quando havia tudo para dar errado. Normalmente, quando existe chance de erro, as coisas entortam mesmo.
Os romanos vibravam com a violência na arena; os esportes foram se refinando e os atletas permanecem vivos e saudáveis. Atualmente, parece que a sede de brutalidade não se sacia com o enfrentamento puramente esportivo e estoura nas arquibancadas. Não se pode deixar ao acaso para ver se tudo dá certo; temos o dever de criar condições seguras para que o público apreciador do esporte possa entregar-se ao entretenimento sem risco. Câmeras de vídeo, fotografia de cada um dos torcedores, ingressos nominais, proibição da presença dos briguentos nos estádios. Existe tempo para fazer dos jogos da Copa em Curitiba um belíssimo espetáculo, daqueles que trazem sorriso ao rosto quando são lembrados. Se der tudo errado, a culpa é nossa, não do destino.
O segundo tema que me chamou a atenção durante a semana foi o avião presidencial comprado pela Bolívia; para quem não se lembra, eles não tinham aeronave para as viagens do presidente Evo Morales e, em algumas ocasiões, o Brasil cedeu aviões e tripulação da FAB para transportar Morales e comitiva. Pois bem, o governo boliviano decidiu comprar um aparelho, mas, pasme, não deu a mínima para a Embraer e foi à Rússia fazer a aquisição.
O avião russo é muito mais caro que o similar brasileiro, de manutenção mais dispendiosa e a tripulação precisa receber treinamento custoso. Por mais que se tente dar conotação técnica, a escolha foi ideológica. Acrescentou-se mais uma birra à fieira das praticadas contra os interesses do Brasil. Temos o dever da boa vizinhança, porque Morales passa e a Bolívia fica. Contudo, está na hora de admitir que ele não deseja nos agradar, tanto que gerou empregos para russos e não para brasileiros.
Quando Evo Morales vier ao Brasil, no caríssimo avião russo pilotado por cubanos, será interessante se lembrar dos brasileiros que deixaram de ter trabalho na indústria da aviação por causa dessa desfeita.
Friedmann Wendpap é juiz federal e professor de Direito na UTP
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