Comemorou-se, semana passada, o centenário do encontro do Pacífico e do Atlântico no Hemisfério Norte. O ganho de tempo para a navegação foi enorme. A vantagem política e econômica para os Estados Unidos, idem. O Canal do Panamá é algo tão colossal que ainda faz perder o fôlego ao pensar na grandeza do empreendimento que começou quando não existiam caminhões, tratores, carregadeiras, patrolas. Lombo de burro, máquinas rudimentares a vapor e milhares de homens trabalhando e morrendo de malária.
Certamente, se houvesse os entraves ambientais atuais ele não seria construído e os navios continuariam a contornar o continente pelo sul, consumindo milhões de toneladas de combustível, desperdiçando tempo. À época, o inferno não estava nos outros, estava na natureza hostil, na carência de equipamentos. Hoje, se alguém pensar na possibilidade de cerrar as eclusas, vai ser tachado de doido.
O mundo sem os canais de Suez e do Panamá, iniciados no século 19, não seria o mesmo. Diga-se, as pontas sul da África e da América são tormentosas, difíceis de navegar. Dobrar essas esquinas exigiu heróis do quilate de Vasco da Gama e Fernão de Magalhães. A rotina da navegação, porém, não é feita de viagens épicas. O barquinho vai, a tardinha cai, o barquinho aporta sem sobressaltos. O comércio exige condições seguras, suaves como as ondas da bossa nova.
O homem chega, já desfaz a natureza, tira a gente põe represa, diz que tudo vai mudar. Sá e Guarabyra musicaram a ruptura provocada pela engenharia que fez o sertão virar mar em Sobradinho. Retrataram a sensação de mudança das condições naturais a partir da vontade e ação. As águas cobriram cidades antigas, deslocando-as para pontos mais altos. Como seria a música para expressar o sentimento de quem agora tem energia elétrica?
A escala da intervenção humana sobre as condições naturais foi astronomicamente maior na construção dos canais de Suez e Panamá porque cindiram continentes. Hércules abriu a passagem entre o Mediterrâneo e o Atlântico. A narrativa mitológica faz tudo muito simples: um empurrão de ombro para cá, outro lá e voilà! A realidade é mais severa que os mitos e o canal aniversariante consumiu mais de 30 anos de trabalho. O resultado é mítico, mas os meios foram absolutamente concretos. Fórmulas mágicas, apenas as da Matemática, escritas à mão, sem computadores eletrônicos.
A história do Canal do Panamá vai além da engenharia, navegação, comércio. Alcança a política. Quando os franceses começaram a obra, o local era território da Colômbia. Ao assumirem-na, os americanos estimularam o separatismo e garantiram a independência do pequeno país ancorando belonaves na costa colombiana. Com isso, administraram o canal até 1999.
O tempo levou a origem viciada e o Panamá, agora controlador do canal, saiu da zona de republiqueta instável para se tornar capaz de ampliar a obra colossal, aumentando o trânsito e tamanho dos navios, classificados em Panamax e post-Panamax.
Infraestrutura é pressuposto para desenvolvimento. Asfaltar picadas de mula do tempo do Brasil colônia mantém a mediocridade. O centenário do Canal do Panamá demonstra que, para ser grande, é preciso pensar grande.
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