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Onda de linchamento de ladrões assusta a Argentina. O (des)governo Cristina Kirchner faz as promessas usuais: mais policiais, equipamentos, viaturas. Ao mesmo tempo diz que "não se pode pedir a quem sente que sua vida não vale dois pesos que sinta que a vida dos demais valha mais de dois pesos". Conclui asseverando que a receita contra a violência é a inclusão. Hum, ouvi isso antes em algum lugar na América do Sul. Se não houver pobreza não haverá violência e, como há miséria, o bandido pobre não é culpado. A culpa é de quem o excluiu.

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A explicação chã da viúva K não se refere, claro, à carência de recursos intelectuais, à mediocridade. Se assim fosse, os corruptos estariam livres da culpa. São ricos de matéria e pobres de espírito. É de se inferir que ela esteja se referindo à carência de recursos materiais. Com isso, a primeira indagação que lateja na mente: a Argentina era, há 80 anos, um dos países mais ricos do mundo; que políticas públicas a empobreceram a ponto de se tornar selvagem e quem as determinou?

Afora a situação específica da deterioração platina, sobram dúvidas atrozes quanto ao pensamento da presidente Kirchner: todos os pobres têm legitimidade para roubar? Qual a linha da pobreza? A do Banco Mundial, que estabelece US$ 1 por dia de renda individual como divisor? Quem ganha um centavo a mais vai para a cadeia e a menos, não?

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Espera-se que o cronista apresente respostas e não fieira de perguntas. Talvez algum leitor até diga que estou no jornal para dar certezas, não para partilhar incertezas. Porém há momentos de tanta perplexidade que fica difícil usar pontos finais, e os de exclamação e interrogação polvilham o texto. Como pode a chefe de Estado se revelar tão banal, com análise de botequim?

Dúvida poderosa que salta da "explicação" primitiva: a pobreza no Brasil diminuiu e a violência aumentou; se não há fome, desemprego, exclusão, a violência teria diminuído. Válida a sabedoria "kirchneana", deveríamos estar iguais à Suécia e eu poderia ter levado a Laika para passear à noite no bairro. Fiquei trancado em casa por medo de ir à rua e ser vítima desses roubos que terminam em tragédia porque a vítima não tem dinheiro suficiente a agradar o meliante.

O marxismo de baixa intensidade, à Gramsci, que contamina a interpretação dos acontecimentos, atribui todas as condutas às condições materiais das pessoas, como se os humanos fossem homo economicus e não homo moralis, como se a abastança material fosse suficiente a instalar a bondade e a escassez ensejasse toda maldade. Para perceber como essa concepção é tola, basta imaginar que a Índia, com seu bilhão de miseráveis e 200 milhões de remediados, deveria ser o lugar mais violento do planeta. Os Estados Unidos deveriam ser paradisíacos.

A hermenêutica do pobrecito que não sabe o que faz – perdoai-os porque eles não sabem o que fazem – é a porta por onde a barbárie invade a civilização. O furto famélico existe, mas é exceção e como tal deve ser tratado. Tomado por regra, faz o paraíso se transformar em inferno e Buenos Aires começa a parecer capital do Brasil.

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