As ideias apresentadas pelo filósofo Michael Sandel, professor da Universidade de Harvard, têm feito sucesso a ponto de haver propagação das aulas por vídeo na internet; viral intelectualizado, diferente dos tombos e gafes que fazem sucesso na rede, as preleções versam sobre o pensamento dos clássicos, explicados de modo acessível. Aristóteles, Hobbes, Rousseau, Bentham, Kant, Rawls se tornam simples de entender na leitura do livro Justiça o que é fazer a coisa certa ou assistir aos vídeos. Examinando problemas morais individuais e coletivos, o professor discute casamento homoafetivo, quotas para minorias, controle ou liberdade de preços em situação de calamidade, aborto, patriotismo, mostrando que a filosofia não é delírio de gente desocupada.
Sandel classifica o pensamento da Filosofia Política, aquela que trata da justeza na repartição dos ônus e bônus da vida em sociedade, em três grandes correntes: utilitarismo que indica ser justa a atitude que assegura a maior felicidade para o maior número de pessoas; liberalismo que aponta como justa a atitude de respeito à liberdade de escolha individual que não macule a liberdade dos outros; virtuosismo que diz ser politicamente justo o cultivo da virtude e a preocupação com o bem comum. Declarando sua preferência entre as teses, Sandel diz que não se alcança sociedade justa simplesmente maximizando a utilidade ou garantindo a liberdade de escolha; é preciso definir valores morais coletivos e incuti-los nas pessoas, mostrando as atitudes conducentes a valores morais positivos.
Ao primeiro olhar a argumentação do professor-filósofo é encantadora porque, partindo de Aristóteles, afirma ser boa constituição política aquela que conduz os cidadãos para a honestidade e retidão moral e que há obrigações independentes da vontade do indivíduo, decorrentes da inserção numa classe e que, apesar da ausência de liberdade em relação a esses encargos, é possível ser livre. O encanto desmorona ao indagar quem define quais condutas são boas e quais, más? O que acontece com quem discorda e se conduz conforme suas próprias definições? Como alguém é livre se há moral do Estado?
Ao viver em Estado desprovido de religião ou ideologia oficial as pessoas perdem as referências para reconhecer na liberdade de opinião, locomoção, conduta pessoal e empreendimento a maior conquista política da gente comum. As elites fruem liberdades em qualquer regime político. As elites sempre são livres. O povo é livre apenas quando se nega ao Estado o poder de incutir crença religiosa ou ideológica.
A liberdade de escolha ocorre dentro das limitações que os grupos, nos quais o indivíduo está inserido, estabelecem. Família, escola, igreja, grêmios, trabalho, modulam as condutas moralmente aceitas ou reprovadas. O poder político erigido em Estado deve existir para garantir ao indivíduo a possibilidade de fazer opções, ainda que elas sejam minoritárias e dissonantes das agregações sociais. A tese esposada por Sandel faz o Estado inibir a liberdade porque, a pretexto de futuro no qual as pessoas sejam boas e justas na perspectiva de quem está no poder, os indivíduos passam a ser tangidos como admirável gado novo.
Deixe sua opinião