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 | Felipe Lima
| Foto: Felipe Lima

A guilhotina fez o pai da química voltar ao pó. Nada se criou e perdeu, tudo se transformou. Pó – ferro, cálcio, água, sódio, cloro, magnésio – foi organizado de modo a que poderoso processador de dados produzisse informações e essas, conhecimento. Voilà, o sopro divino deu anima ao barro e esse vivente teve o vislumbre químico da vida, apresentação singular da energia e matéria.

Em 1789, Lavoisier publicou o Tratado Elementar de Química, último grande evento da separação entre a ciência e o misticismo. Newton, 100 anos antes, pariu a física moderna, mas acreditava em pedra filosofal e magias. O nascimento da química é também o início da modernidade, da sensação de controle sobre a natureza.

Pois bem, ex hypothesi, imagine-se que o manuscrito original houvesse sido destruído por acidente, não chegando à gráfica, e Lavoisier morresse sem registro de suas experiências e enunciados. A informação teria se transformado ou se perdido? Quanto demoraria para outra pessoa perceber os fundamentos da química, organizar os dados e apresentar informações aptas a gerar e transmitir conhecimento?

Se houver pane energética total no planeta, perderemos todas as informações que estão fora dos livros físicos?

Havia “química” rara entre Madame et Monsieur Lavoisier: ela traduziu e comentou autores britânicos da nova ciência; também fez a publicação póstuma de textos do marido. Porém, não meramente enviou manuscritos ao prelo; ela complementou raciocínios e corrigiu fraturas lógicas. Qual a probabilidade estatística de dois gênios se casarem e revolucionarem a ciência? Demorou 100 anos para que Marie e Pierre Curie reeditassem algo parecido, porém já laboraram sobre o conhecimento deixado pelos Lavoisier.

A entropia da informação pode ser total, deletiva, não mera mudança de apresentação organizacional de energia/matéria. Matar o mensageiro deleta a mensagem. O big data pode sumir como se nunca houvera existido. A cultura de povo ágrafo some na morte das pessoas que a portam. A proteção do acervo informacional em linguagem compreensível e mídia legível é fundamental para evitar que a cultura da humanidade dê lugar ao nada.

A informação vem do nada, não do pó que é algo. É criação da mente. Era o nada e o verbo fez alguma coisa. Registrada a informação, leitores entenderam e grafaram outra informação e assim a corrente de registros e incrementos do teor informacional foi atravessando os séculos, formando a cultura humana.

É de Lavoisier et alli o livro O Método de Nomenclatura Química, publicado em 1787. A sequência “fato – ideia acerca do fato – palavras que expressam essas ideias” foi tratada como fundamental para a ciência. A construção da informação, seu registro, transmissão, apreensão, compreensão e formação do conhecimento eram preocupação do gênio. Se as palavras fossem de má qualidade, diz ele, não haveria ciência.

Enquanto a energia elétrica mantiver elétrons em posições estáveis, os registros de informações nos computadores estão garantidos. Se houver pane energética total no planeta, perderemos todas as informações que estão fora dos livros físicos? Voltaremos a rabiscar paredes de cavernas?

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