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Papado palestino

 | Ilustração: Felipe Lima
(Foto: Ilustração: Felipe Lima)

Francisco, seguindo João Paulo II, distingue o gládio espiritual do temporal e não se omite ante à secularidade da política. O fim do embargo americano a Cuba, a afirmação peremptória do genocídio dos armênios, o reconhecimento da Palestina como Estado soberano. Exemplos de atuação em nome da dignidade humana, não desse ou daquele credo específico.

É o guia dos católicos romanos e, símile ao Dalai Lama, referência mundial quando se trata de espiritualidade, firmeza, suavidade. Papado que vai além dos fiéis. O comentarista Juan Arias do Jornal espanhol El País, diz que Francisco também é o papa dos ateus cristãos. O oxímoro é proposital, para sinalizar o entendimento franciscano de que o ateísmo é negar-se ao próximo, não a Deus. Francisco fala para todos, incluindo os cristãos que amam a humanidade como expressão divina.

Todo aparato moderno que pesa sobre a estrutura básica do Estado é inovação muito recente

Levar Raúl Castro a dizer, em arroubo de espontaneidade, que frequentará missas, é coisa de craque ao estilo Pelé. Talvez alguém pense que eu deveria dizer Maradona ou Messi, mas não, isso não! O papa é argentino; o deus dos gramados, brasileiro!

O reconhecimento não cria um Estado, apenas declara algo que existe. Os palestinos, contra toda adversidade externa e interna, avançaram na estruturação e consolidação de organismo político que tem os elementos básicos – território, povo e governo – para alçarem soberania.

Existe discussão infindável sobre o conceito de Estado e de soberania. Os componentes materiais são fáceis de perceber: terra e gente. A questão se complica quanto ao governo. Há zonas do Oriente Médio e da África Oriental onde existem os três componentes, contudo não conseguem combiná-los de modo a gerar soberania, algo que pode ser definido como a capacidade de manter a segurança interna e externa ao longo do tempo, sem recorrer à violência real e contínua.

Quando Estados antigos, consolidados, se relacionam com o Estado da Palestina de igual para igual, reconhecem que ele alçou complexidade organizacional suficiente para governar a si próprio, sem ingerência próxima ou remota.

Todo aparato moderno que pesa sobre a estrutura básica do Estado é inovação muito recente, algumas com poucas décadas, como o sistema público de saúde e previdência. Os palestinos não têm exigências tão intensas e extensas quanto às que temos em relação ao Estado. Para eles, basta por ora expressar a autodeterminação.

O tratado firmado entre a Santa Sé e o Estado da Palestina versa sobre a minoria cristã e deve ser comemorado tendo em consideração a conjuntura de violência por faccionismo religioso que ocorre perto dali. Sempre é bom lembrar da esposa do finado Yasser Arafat, cristã, para perceber que as atrocidades do Estado Islâmico, da Al-Qaeda e afins não representam toda a extensão ideológica das pessoas de credo muçulmano. Os palestinos, em especial, almejam Estado não teocrático.

Assim, em apoio ao papa, o Brasil poderia se articular com o Estado Palestino para proteger povos cristãos vítimas de etnocídio em regiões do Iraque, Síria, Quênia. Atitude mais meritória do que viajar como mascate mercadejando nossas empresas de construção civil e financiamentos subsidiados por dinheiro público.

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