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Obama afirmou que Is­­rael não deve construir novas casas para seus nacionais em áreas na Cisjordânia, sob pena de inviabilização do esforço pela paz com os palestinos. Neta­­nyahu, primeiro-ministro de Israel, fez ouvidos moucos e exigiu, como condição para estender a moratória das obras, que Abbas, chefe do quase-Estado Palestino, reconheça a existência de Israel como Es­­tado judaico. Os palestinos, por seu lado, dizem que já reconheceram o Estado de Israel em ocasiões anteriores, quando firmaram acordos de convivência. No­­vo inverno se aproxima para congelar os esforços de entendimento e, quando as cidades de israelenses estiverem edificadas no território Pa­­lestino, a situação ficará mais complicada. Nevará sobre as pedras de Jerusalém.

Parece não bastar a Netanyahu que os palestinos reconheçam o Estado de Israel ao lado do Estado Palestino – dois Estados para dois povos; ele quer dos palestinos a declaração de que aceitam o Estado Judaico de Israel. Ao olhar desavisado pode parecer que a diferença é irrelevante, mas se está diante do fundamento da existência do Estado. A República de Israel e a República Judaica de Israel, são objetos distintos. A rigor, Netanyahu quer consolidar Israel como Estado teocrático, isto é, cuja fundação é manifestação da vontade de Deus e não dos homens. Ora, a vontade de Deus é inegociável, pois ninguém tem procuração para falar em nome dele. Por força disso o desejo divino deve ser realizado integralmente, sem interpretações restritivas ou extensivas. Não há permissão para exercícios hermenêuticos que adaptem o querer divinal às circunstâncias. A palavra de Deus deve ser cumprida tal qual posta no livro sagrado, porque é a expressão da perfeição e não deve ser maculada por ajustes fei­­tos pelos humanos. A partir desse pressuposto, qual negociação é possível? Ora, se Deus mandou ocupar um território, como compor a divergência com quem já está lá? Fundamentar o Estado na vontade divina impede qualquer transação com quem não aceita esse alicerce. Diga-se, no ca­­so is­­raelopalestino, não havia, da parte dos desalojados, componente religioso na resistência. O surgimento de teorresistência é fruto simétrico da intenção de consolidar Israel como teocracia. Para uns, Deus mandou fazer o Esta­­do; para outros, Deus mandou resistir a essa criação. Mil vidas mal gastadas por cada mandamento, como canta Jorge Drexler.

Todas as teocracias têm o mesmo defeito genético, sendo irrelevante a fé religiosa que pretende se expressar pelo poder político do Estado, pois excluem da cidadania quem não professa o credo estatal e eliminam a privacidade, invadindo todos os espaços de vivência individual e familiar. Ainda que haja esforço para manter um fio de democracia, com eleições e mandatos outorgados pelo povo, esse processo é limitado àquilo que Deus permite, a exemplo do que se vê no Irã. Entre os Estados teocráticos há nuances, mas na essência a in­­compatibilidade ôntica com a dignidade de todos os indivíduos, tão só pela condição de humanos, os torna muito semelhantes.

É de relevo dizer que o deus adotado pelo Estado pode ser metafísico ou físico; a questão de fundo é a supressão da diversidade. Quando o poder político su­­prime a resistência, impondo uma única maneira de pensar como a socialmente correta, o resultado é desastroso para a criatividade e liberdade dos indivíduos. Teocracias (Israel, Irã, Arábia Saudita) ou ideocracias (Cuba, Coreia do Norte, Venezuela), são incompatíveis com a pluralidade típica da condição humana. Nessa medida, o monoteísmo e a teocracia fazem par perfeito, pois é mais fácil controlar a crença num único Deus e estabelecer pa­­drões de conduta a partir dessa unicidade do que a difusão dos credos e condutas do politeísmo.

À Drexler, sentir-se moro judeu que vive entre cristãos, não alistado porque a guerra é má escola, não importa o disfarce que vista, e não há pedra que valha uma vida; entregar-se à quimera da paz com a certeza de que o solo sobre o qual se pisa seguirá depois que o vento do tempo levar o pó das nossas doutrinas.

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