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Friedmann Wendpap

Pobre Europa rica

Das manchetes de economia dos últimos tempos, um assunto chama muito a atenção: "Alemanha eufórica com o seu crescimento"; "Alemanha alcança crescimento recorde depois de 1990"; "A Europa olha para a Alemanha esperando socorro". Saltando para o passado as notícias eram outras: "Alemanha invade a Polônia"; "Alemanha contorna a Linha Maginot e invade a França". Numa e noutra situação, a Europa olha para a Alemanha e pede socorro. Antes, para escapar da Alemanha e agora, da bancarrota. São tempos interessantes e demonstram o acerto da construção do acordo político franco-germânico nos anos 50 em torno do carvão e do aço. A liderança industrial germânica permanece; porém antes ela exportava guerra e hoje exporta máquinas, remédios, equipamentos médicos, carros de luxo. A configuração de poder na Europa continental permanece a mesma desde a segunda metade do século 19, mas a engenharia política construiu interação entre os países e já são quase 70 anos sem belicosidade e destruição.

O Reino Unido nunca foi potência na Europa; era potência mundial localizada na imediação da Europa. A sua alvorada e ocaso não alteraram de modo relevante os acontecimentos no continente. A não integração na zona do euro acentuou o insulamento britânico das mazelas e alegrias dos continentais. Por isso, ao falar da Europa, a posição pivotante a leste e oeste é da Alemanha. Russos e portugueses passam por Berlim. Na maluquice de Hitler, seria manu militari. Ocorre, não há canhões na Europa atual e a Alemanha mantém a centralidade. Por quê? A explicação topográfica é por demais singela. Dizer que o território alemão está no meio da Europa, gerando vantagem para os relacionamentos é parte da explicação. Há exemplos mundo afora de povos bem situados fisicamente e mal posicionados política e economicamente, como o Iraque. O Japão, ao contrário, está na borda física da Ásia e no centro do processo político e econômico.

A economia é a resposta mais completa, não a única, para explicar o fenômeno alemão. A base industrial foi destroçada na guerra, mas conhecimentos e habilidades permaneceram. Com o impulso do Plano Marshall, destinado a mitigar o peso da União Soviética, a Alemanha ascendeu rapidamente e voltou ao topo, figurando por décadas como a terceira economia do planeta. A França e a Itália também foram beneficiadas pelo dinheiro farto dos americanos e não tiveram igual sucesso, tanto que flertam com a recessão desde 2008. Os que eram pobres e foram convidados para o crescimento propiciado pela locomotiva germânica não compreenderam bem o espírito da coisa e se comportaram como famélicos em banquete: tiraram a barriga da miséria às custas dos outros e, no momento, estão em ressaca depois da festa.

Os PIGS (Portugal, Itália, Grécia, Espanha), no acrônimo maldoso, além da Irlanda e a Islândia, estão em completa dependência da boa vontade alemã para os empréstimos que mantêm suas economias em atividade, impedem a quebra de bancos e a insolvência do Tesouro público. A Grécia, em especial, passou muito perto das Repúblicas de Banana e foi salva por generosas doses de dinheiro alemão. A Alemanha salvando a Europa! Não apenas no aspecto econômico, mas, sobretudo, assegurando as condições para que o projeto de formação da Federação Europeia, dos Estados Unidos da Europa, tenha continuidade. A Alemanha contribuindo para que se consolide o lema in varietate concordia (concórdia, na diversidade) é epifania do valor mais profundo da democracia que pode produzir frutos mesmo em solo acre onde vicejaram tiranias e fobia à exuberância da humanidade.

A austeridade, a quadradice teutônica, são intransportáveis para os pródigos trópicos. Todavia, o mau exemplo dos perdulários pode servir para corrigir os passos bêbados que a nossa economia passou a dar faz uns dois anos.

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