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Barack Obama, presidente dos Estados Unidos, foi agraciado com o Nobel da Paz pelos esforços pa­­ra reforçar a solução diplomática dos conflitos e a cooperação en­­tre os povos, causando surpresa até para o premiado que disse supor tenha sido um modo de es­­timulá-lo a fazer o que disse que faria para diminuir a tensão no Iraque, Afeganistão, Irã. Premia­­do não pelo que fez, mas pelo que pretende fazer. Sem dúvida, aposta alta do Conselho da Fun­­dação Nobel que seleciona as pes­­soas para atribuir a distinção. Embora para nós, na periferia do mundo, pareça inadequado o critério adotado, os méritos de Oba­­ma são muitos e o prêmio funciona como reforço para o enfrentamento político interno, mais ou menos como se os povos dissessem aos americanos que as teses pacifistas do seu novo presidente são do interesse global.

Todavia, para os brasileiros há outra perspectiva a ser observada: não há nenhuma bandeirinha verde e amarela na lista dos premiados. O primeiro Nobel da Paz foi para o fundador da Cruz Vermelha, em 1901. Os prêmios foram se sucedendo e dois argentinos – Saavedra Lamas e Adolfo Esquivel – o receberam; quatro presidentes dos Estados Unidos e um vice-presidente, o dalai la­­ma, Nelson Mandela e Frederik de Klerk, Kofi Annan. A lista é longa e não há brasileiro. Os ame­­ricanos são os campeões, pois também contam com premiados que ocupavam cargos de menor estatura – Kellog, Mar­­shall, Kissinger – mas tiveram papel importante na política internacional. Talvez um sintoma da condição de gigante gasoso; grande, sem peso, irrelevante nas relações internacionais.

Na área da ciência econômica os americanos contam com mais de quarenta laureados; na literatura a rol dos laureados é mais aberto, alcançando o Japão, Ín­­dia, Turquia, Rússia, Finlândia, Islândia, Canadá, Córsega e, oito vezes, os Estados Unidos. Aqui a língua portuguesa foi ouvida apenas em 1998, com Saramago. Na medicina, um português, dois argentinos; americanos, mais de quarenta. Na física, sessenta e um norte-americanos, uma miríade de europeus, al­­guns chineses, japoneses e gente de lugares exóticos, como Pa­­quistão e Azer­­baijão; brasileiro, nem para distinguir entre física e tísica. Na última categoria, química, nem se fale: há letão, ar­­gentino, taiwanês, mais de quarenta americanos, dúzias de europeus. Bra­­si­­leiro, que mico, nenhum!

O zero redondo, absoluto, diante do Comitê de seleção do Nobel é uma murchada no balão do nosso ego olímpico. Falamos a favor e contra o prêmio atribuído a Obama como se fôssemos doutos no assunto. Apedeutas, é o que somos.

A eleição do ano que vem será dominada por bolsa família, bolsa isso, bolsa aquilo. Que tal uma bolsa Nobel? Não, não estou fa­­lando de "réplica" Louis Vuitton feita na China; arremedo, imitação barata que nivela por baixo. Falo da possibilidade dos candidatos a governador e presidente da República lançarem o desafio da conquista de prêmios da Fundação sueca na área da ciência como plataforma de campanha eleitoral. Pode parecer delírio pensar nisso diante da forte ideologia de que ensinar matemática, física, química, biologia, é coisa de direita e, portanto, atraso de vida. Ser progressista, de esquerda, é ficar de lero-lero emancipatório para estudantes que não sabem localizar o Brasil num mapa.

A ignorância é servidão; quem não sabe matemática nem para entender que há juros escorchantes no financiamento de uma geladeira, não se emancipa, não se torna senhor de si mesmo. Assumir o projeto de levar o país ao rol dos laureados exige a mudança da concepção dominante de que a ignorância faz parte do jeito brasileiro de ser e viver, como se a burrice fosse alegre. Ensinar e aprender são atos de esforço, não de entretenimento.

Friedmann Wendpap é juiz federal e professor de Direito da UTP.

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