O rolezinho de multidão nos centros comerciais de algumas cidades brasileiras se tornou objeto de acirrados debates socioantropoideológicos. As mídias sociais, com a perfunctoriedade congênita, explodiram em críticas ad hominem, ao estilo Jaccuse: você é elitista, racista, conservador, reacionário, caretão. Inundação de adjetivos em deserto de substantivos. Indicadores enrijecidos revelam preconceitos obliteradores da inteligência, complicando o debate em torno de questão singela.
Somos equipados pela natureza com o medo da multidão: um boi não assusta, uma boiada espalha pânico. Sabemos, instintivamente, que o comportamento multitudinário difere do individual e, de regra, para pior. A brutalidade grupal é largamente estudada, inclusive no que tange a condutas durante guerras. Assim, o medo que os de fora da multidão sentem é natural, e não produto de cultura discriminatória contra pobres, jovens, mal-vestidos, de outra cor, raça, religião, opinião política. Confundir medo com discriminação e desconhecer a potencialidade explosiva de multidão sem organização é negar a natureza humana. Basta se lembrar de junho de 2013.
Quem teve medo não deve ficar com remorso por atitude "socialmente incorreta". Agiu como faria qualquer humano, desde os primórdios, em posição semelhante. A alternativa, nessas situações limítrofes, é também se tornar algoz. Como a decisão é individual, sem a desumanização instigada pela pressão coletiva, a maioria prefere se defender na posição de presa, não predador, e foge.
Os comerciantes que baixaram as portas agiram como qualquer homólogo em comércio de rua protegendo o patrimônio da possibilidade de dano decorrente de algum estopim de agressividade coletiva. De novo, mas não de modo anáfaro, os lojistas foram vítimas, não algozes.
Há discussões jurídicas sobre o acesso aos centros comerciais. Data vênia, os shoppings são áreas particulares, tal como as galerias Suissa, Tijucas ou Lustosa. Tanto que cerram os portões à noite. A rigor, os corredores de granito são espaço particular e o proprietário singular ou plural pode excluir ou incluir. Óbvio: como qualquer direito, há limitações, mas essas tocam a aspectos da dignidade humana, pelos quais não há direito a incluir ou excluir a partir da individualidade. Não é juridicamente correto proibir a entrada de altos ou baixos, brancos, negros, asiáticos, cristãos, muçulmanos, eleitores desse ou daquele partido. Contudo, há liberdade para opção empresarial que leve a exigir agendamento, cadastro, pagamento de ingresso para entrar no shopping ou limitação da quantidade de pessoas.
É de se ressaltar que os participantes do rolezinho não são pobres nos moldes das cartilhas de esquerda. Nenhum famélico ou andrajoso. Ao contrário, gordinhos e bem vestidos dentro do padrão "bandido desencanado" que as calças sem cinto querem denotar. O flash mob foi viral que transitou entre milhares de telefones caros que acessam internet. Coisa de pobreza relativa, não absoluta.
Não há revolução em marcha, apenas um dos efeitos da massificação da capacidade de comunicação propiciada pelas novas tecnologias. O mundo é aldeia digital.
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