• Carregando...
 | Felipe Lima
| Foto: Felipe Lima

Bonitinhos de Hollywood pisaram nas terras tórridas da África subsaariana em solidariedade às vítimas da guerra civil no Sudão. O genocídio de etnias não árabes veio em cenas tristes de gente famélica, famílias separadas. Foi, depois da Bósnia, o mais popstar dos conflitos, com campanhas de coleta de fundos, ações humanitárias, presença maciça de ONGs, mandado de prisão do Tribunal Penal Internacional dirigido ao Senhor da Guerra, Omar Al-Bashir.

O plus de maldade foi o estupro das mulheres como ato de humilhação étnica pelos janjawid, algo como "diabo a cavalo", que espalharam medo, dilaceração da honra e muitos descendentes de pele mais clara que, rejeitados pelas mães, se tornaram vítimas de segunda geração, dificultando o esquecimento, a superação da guerra.

Os esforços internacionais levaram à secessão, com a formação do Sudão do Sul, o caçula dos Estados, nascido em 2011. Estabelecidas as fronteiras, imaginou-se que a situa­­­ção fosse endireitar, até como tributo ao denodo das celebridades que apoiaram a causa da independência para chegar à paz e, quiçá, ao progresso. Porém, a quartelada da semana passada, com tanques nas ruas, matraca das kalashnikov, cadáveres à beira das estradas, trouxe de volta a rotina daquelas bandas do mundo.

O enredo é tão conhecido que se pode imaginar a sequência da narrativa sem ler o noticiário: o presidente, membro da tribo Nuer, foi confrontado pelo vice, membro da tribo Dinka, esmagou violentamente a rebelião e, fardado como generalíssimo latino-americano, decretou estado de sítio, fez discurso na tevê denunciando os rebeldes como autores da matança e, principalmente, acusando o vice de querer disputar a próxima eleição presidencial em 2015. Ingredientes da comédia bolivariana misturados com a composição tribal de partes da África. O Sudão do Sul nasceu como Estado falido, natimorto.

É intensa a perplexidade ao ver as elites políticas desses locais – Sudão, Etiópia, Eritreia – digladiando por poder sobre a miséria. As condições ambientais são adversas, com estiagem severa. Diante da natureza bruta, a atitude racional seria a construção de instituições aptas a assegurar educação com a repercussão econômica. Se a terra nada dá, os cérebros podem produzir. Que falta faz um Mandela para eles!

É fácil acusar os antigos colonizadores europeus, atribuindo-lhes herança maldita que causou o atraso. As análises acadêmicas ocidentais são autoflagelativas, mea culpa com chibatadas e cilício lacerando as carnes. Ainda que provoquem catarse esquerdoide, não identificam as causas da insistência em permanecer alijado do desenvolvimento. A região, livre dos europeus, continua tão rudimentar que está sendo colonizada pelos chineses. A colonização não causou o atraso. Ela ocorreu por causa da assimetria tecnológica e, mudando o colonizador, a sujeição a interesses estrangeiros continua existindo.

As formas tribais de organização social são incapazes de concorrer com os resultados propiciados pelas estruturas políticas que formam Estados. Se a China ainda fosse um aglomerado de tribos, não veríamos o jipinho circulando pela Lua.

São pobres porque não se entendem, ou não se entendem porque são pobres?

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]