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Em julho de 1980, meu pai me levou até a Avenida Tiradentes, em São Paulo, para ver o papa. Depois de tanto tempo, a imagem está nítida: João Paulo II passa dentro do papamóvel e acena para os fiéis. Faz 33 anos. Meu pai morreu, o papa João Paulo morreu – mas agora eles estão de tal maneira perto de mim quanto é possível alguém estar. Olha lá ele, pai. Bom dia, papa!

Na última quarta-feira, quando o novo papa acenou para a multidão na Praça de São Pedro, eu me lembrei do dia em que vi João de Deus. Neste ano, o papa polonês se tornará santo pelas mãos de um cardeal que ele criou em 2001. O que você acha disso, pai?

Durante a Segunda Guerra Mundial, quando um interlocutor mencionou a opinião do papa sobre determinado assunto, Josef Stalin perguntou sarcasticamente: "E quantas divisões tem o papa?" Ele não poderia imaginar que o império soviético começaria a ruir pelas mãos de um papa que não tinha nenhuma divisão, mas conhecia a força da unidade. Irônico, não é, pai?

Era um papa diferente, esse João Paulo II. Primeiro não italiano a ser eleito em quatro séculos, praticava esportes e havia sido ator de teatro na juventude. Até hoje eu gosto de imitar o seu forte sotaque falando português. Também Francisco é um papa diferente. Primeiro não europeu a ser eleito em muitos séculos, anda de metrô, gosta de futebol e lê seu xará Jorge Luis Borges. Imagine a cara do recepcionista do hotel quando ele apareceu para pagar a conta, logo depois de ser eleito. Estou trabalhando na imitação do novo papa. Será que vai ficar boa, pai?

João Paulo contribuiu para derrubar o Muro de Berlim; Francisco vai lutar contra o muro de estupidez que se ergueu no mundo moderno, especialmente na América do Sul. Os militantes anticristãos sabem disso – e começaram a difamá-lo minutos depois do encerramento do conclave. Previsível, não, pai?

O mundo moderno padece de um lamentável provincianismo cultural. Essa miopia do pensamento, apontada por T. S. Eliot, consiste em achar que todas as coisas sempre evoluem; o presente seria melhor que o passado simplesmente porque vivemos nele. Assim, podemos estar certos de que o papa Francisco será atacado por defender as tradições cristãs. Para os provincianos temporais, militantes deste mundo, o único papa argentino aceitável seria Che Guevara ou alguém muito parecido com ele. Difícil, hein, pai?

"Os testemunhos da ressurreição falam de algo paradoxal, qualquer coisa que supera toda experiência, mas que está presente de modo absolutamente real", escreveu o papa emérito Bento XVI. Eis aí uma boa descrição da Igreja, que há 2 mil anos se reinventa permanecendo sempre a mesma. Olha lá ele, pai. Bom dia, Francisco! Há 33 anos eu espero a sua bênção.

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