Nas redes sociais, as pessoas vivem fazendo listas de "dez melhores livros", "dez melhores filmes", "dez melhores músicas" e assim por diante. Outro dia resolvi elaborar não uma antologia, mas uma "antalogia", com as piores porcarias que já li nesta vida. Não pretendo aqui falar sobre esses terríveis livros, que incluem A Ilha, de Fernando Morais; As veias abertas da América Latina, de Eduardo Galeano; Sem tesão não há solução, de Roberto Freire; e o panfleto A moral deles e a nossa, de Trotsky. É melhor não me estender mais sobre essas leituras para não passar (mais) vergonha.

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Mas, como disse Dostoievski, "a beleza salvará o mundo". Então eu pensei que meu pai só me indicou livros bons durante a vida. Aos 20 anos, por insistência de Paulo, li Guerra e Paz, a obra-prima de Tolstói. Agora tenho medo de reler o romance, para não estragar a imagem de André Bolkonski, Pedro Bezukhov e Natasha Rostov, personagens que amo intensamente até hoje, como se fossem pessoas do meu convívio diário.

Meu pai não era um grande leitor de poesia, mas gostava muito de Manuel Bandeira. Posso ouvir claramente a sua voz recitando Pneumotórax, Pasárgada e Profundamente. Ou ainda: "O bicho não era um cão, / Não era um gato, / Não era um rato. / O bicho, meu Deus, era um homem".

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Lembro-me de uma noite de chuva em que me retirei para o quarto dos fundos e li as primeiras frases de Henry Miller em Trópico de Capricórnio: "Depois que nos livramos do fantasma, tudo segue com infalível certeza, mesmo no meio do caos. Desde o começo, nunca houve senão o caos: era um fluido que me envolvia, e que eu aspirava através das guelras". De vez em quando, eu começo a repetir essas palavras na rua; as pessoas devem achar que sou louco.

De todos os autores que meu pai me indicou – Joyce, Proust, Kafka, Freud, Camus, Borges, Nelson Rodrigues –, o único que realmente eu não aceitava era Guimarães Rosa. Pois na semana passada, depois de ver a foto de um menino de óculos no jornal, resolvi ler a novela Campo Geral e testemunhei a epifania do personagem Miguilim ao colocar os óculos oferecidos por um visitante: "Miguilim olhou. Nem não podia acreditar! Tudo era uma claridade, tudo novo e lindo e diferente, as coisas, as árvores, as caras das pessoas. Via os grãozinhos de areia, a pele da terra, as pedrinhas menores, as formiguinhas passeando no chão de uma distância. E tonteava. Aqui, ali, meu Deus, tanta coisa, tudo..."

E foi então que eu vi meu pai outra vez.

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